O Brilho Espiritual da Alegria

Há quase três mil anos, um homem mencionado nas Escrituras como alguém segundo o coração de Deus (ver 1 Samuel 13:14; Atos 13:22) clamou ao Senhor após ser confrontado por seu terrível pecado no caso de Bate-Seba e Urias. A antiga fonte de esperança dele havia parado de jorrar. A fonte daquele mesmo coração que outrora enfrentou Golias havia secado. E ele implorou fervorosamente:
"Cria em mim, ó Deus, um coração puro e renova em mim um espírito reto. Não me lances fora da tua presença e não retires de mim o teu Espírito Santo. Torna a dar-me a alegria da Tua salvação e sustém-me com um espírito voluntário" (Salmos 51:10-12, grifo nosso).
O que exatamente o rei Davi estava pedindo ao falar sobre a alegria da salvação?
Mais tarde, Hebreus 12:2 revelou o foco de Jesus Cristo durante Seu terrível sofrimento: "...em troca da alegria que Lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus". Sob uma perspectiva humana, “a alegria da cruz” soa como um contrassenso, o maior que se possa imaginar!
Essa mesma alegria nos é destinada. Assim como aquele senhor da Parábola dos Talentos, que representa Cristo, declarou aos seus servos fieis: “Venha e participe da alegria do seu senhor!” (Mateus 25:21-23, NVI).
Ao lermos essas passagens, cabe a nós entender o que realmente significa essa alegria. Ela é apenas um destino futuro ou representa também um percurso em direção ao Reino de Deus? Compreender como as Escrituras definem a alegria e discernir o que ela realmente retrata são essenciais para que os discípulos de Jesus Cristo entendam, abracem e internalizem plenamente seu chamado de seguir a Cristo (ver João 21:19).
A diferença entre prazer e alegria
Primeiramente, é fundamental compreendermos a distinção entre prazer e alegria. O prazer provém de fatores externos agradáveis que surgem em nosso caminho e que nos fazem sorrir, gargalhar e até pular de alegria. Os cristãos deveriam sentir prazer? Certamente! E vamos nos aprofundar nesse tema.
A alegria é algo implantado em nós pelo Espírito de Deus, produzindo um sorriso confiante e permanente em nosso coração, mesmo que as circunstâncias imediatas ou os panoramas futuros se mostrem humanamente desafiadores. Isso significa sentir o ritmo vivo do Espírito de Deus que habita em você.
A luz espiritual da alegria não surge de estímulos externos impactantes, mas irradia de dentro para fora, brilhando tão intensamente que nem o ser humano nem Satanás conseguem apagá-la, a menos que permitamos. Ela é mais do que uma simples luz de presença deixada na escuridão. Ela é a presença ininterrupta e espiritualmente luminosa do Espírito de Deus que habita em nós — a mesma com a qual Deus fez surgir a luz em meio à escuridão no primeiro capítulo de Gênesis.
Então, como esse sorriso confiante em nossos corações cresce, permanece e amadurece enquanto atendemos ao convite de seguir Jesus? Em tudo isso, precisamos lembrar que nosso Pai Celestial, através de Cristo, está nos chamando para um relacionamento — com Ele sendo nosso Deus e nós sendo Seu povo (2 Coríntios 6:16). Deus cumpre a parte que Lhe cabe nisso, como apenas Ele consegue, mas nós também temos nosso papel. Por essa razão, isso é chamado de relacionamento! Deus nos concede o “dom do Espírito Santo” (Atos 2:38), semeando em nós uma alegria que gera frutos (ver Gálatas 5:22). Como todos sabemos, o fruto de uma árvore cultivada não amadurece da noite para o dia. Ele precisa de luz, água, solo nutritivo e adubo, tudo sob a supervisão de um responsável atencioso. Além disso, esse fruto precisa resistir a todos os elementos imprevisíveis de cada estação do ano.
Quando Deus nos diz para “andar no Espírito” (Gálatas 5:16), isso significa que precisaremos nos levantar e avançar com Ele, mesmo diante dos obstáculos que desafiam nossa condição humana — ao mesmo tempo reconhecendo que não estamos sozinhos nessa jornada! E é isso, meus amigos, que alarga esse sorriso em nossos corações, o qual não pode ser tirado de nós porque está selado pelo Espírito de Deus (ver 2 Coríntios 1:21-22).
Lembremos da primeira mensagem de Jesus para uma “grande multidão” (Lucas 14:25). Ele disse-lhes: “E qualquer que não levar a sua cruz [o fardo da própria vida] e não vier após mim não pode ser Meu discípulo” (versículo 27). Evidentemente, essa metáfora se refere ao peso da crucificação, algo que o público daquela época compreendia perfeitamente. Mas essa seria a melhor maneira de começar um movimento? Segundo a visão humana, não! Segundo a visão divina, sim! Em suma, antes de você ganhar uma coroa, terá que carregar uma cruz — em parte por suas escolhas e em parte por causa das ações de outras pessoas. Nesse ponto, Jesus é muito sincero em Sua mensagem. Ele nunca afirmou que o caminho seria fácil. Porém, Ele garantiu que tudo valeria a pena — por causa da alegria que estava posta diante dEle e de todos nós, conforme enfatizado em Hebreus 12:1-2.
Compartilhar essa alegria e perseverar
Retornando ao clamor do rei Davi no Salmo 51, repare que seu pedido para que a alegria da salvação lhe fosse restaurada não era algo meramente voltado para si mesmo, mas carregava a intenção de alcançar e influenciar outras pessoas. Vamos concluir essa história dele, que também se torna a nossa, com o seguinte versículo: “Então, ensinarei aos transgressores os teus caminhos, e os pecadores a ti se converterão” (versículo 13). O coração e os pensamentos dele transcenderam a si mesmo. Ele vislumbrou como sua trajetória, sob a condução de Deus, seria capaz de influenciar positivamente outras pessoas, não apenas por suas palavras, mas pelo que ele conseguiria expressar ao viver em uma condição permanente de submissão e transformação nas mãos do Deus vivo. E esse impacto ecoou através dos séculos, alcançando a mim e a você.
Em qualquer situação que enfrentemos, devemos sempre manter o foco no objetivo supremo que Deus está buscando alcançar. Por isso é que a carta de Tiago começa com um ensinamento que pode parecer desconcertante à primeira vista: “Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações [Como assim?], sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança. Ora, a perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes” (Tiago 1:2-4, Almeida Revista e Atualizada).
Como isso se aplica na vida real de nosso tempo presente, quando o brilho espiritual daquele sorriso confiante no coração, que suportou tantas agressões externas, começar a enfraquecer?
A epístola aos filipenses nos entrega, de forma sistemática, a orientação necessária para essa cura espiritual:
“Alegrai-vos sempre no Senhor [não em nós mesmos — está sendo assim?]; outra vez digo: alegrai-vos [caso não tenham entendido na primeira vez]... Não andeis ansiosos de coisa alguma [aquilo que pode estar em nossa própria lista?]; em tudo, porém, sejam conhecidas, diante de Deus, as vossas petições, pela oração e pela súplica, com ações de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento [melhor do que os fatos da realidade humana], guardará o vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus” (Filipenses 4:4-8, Almeida Revista e Atualizada).
Quando um judeu diz shalom para alguém, algo especial está sendo compartilhado. O cerne não é que Deus lhe garanta uma vida livre de dificuldades, mas sim que Ele lhe conceda o necessário para superar o que quer que surja em seu caminho. O Salmo 23 declara que, tendo o Senhor como nosso Pastor, todas as nossas necessidades serão supridas (versículo 1). Ainda que caminhemos por vales sombrios, não temeremos, pois contamos com a presença e o auxílio de Deus (versículo 4).
O segredo dessa alegria
A epístola de Tiago termina da mesma forma que começou, tratando sobre a importância de suportar as provações com fé. Ela declara: “Ouvistes qual foi a paciência de Jó e vistes o fim que o Senhor lhe deu; porque o Senhor é muito misericordioso e piedoso” (Tiago 5:11).
Qual era o segredo de Jó para conservar a luz espiritual da alegria mesmo enfrentando dores terríveis e a perda de tantas coisas em sua vida física? Encontramos essa resposta em Jó 19:25, onde ele afirma: “Porque eu sei que o Meu Redentor vive, e que por fim se levantará sobre a terra”. O segredo de Jó também nos pertence. As tempestades da vida certamente virão e tentarão minar esse sorriso confiante de nossos corações, o qual é uma manifestação da graça divina, mas vamos resistir através de uma fé ativa na promessa de nosso Redentor, que disse: “Eis que Eu estou convosco todos os dias, até à consumação dos séculos” (Mateus 28:20).
Antes de nos despedirmos, recordemos da revelação rítmica desse salmo: “Cantai ao SENHOR, vós que sois Seus santos, e celebrai a memória da Sua santidade. Porque a Sua ira dura só um momento; no Seu favor está a vida; o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã” (Salmos 30:4-5).