Será Que Um Deus Amoroso Puniria as Pessoas Para Sempre no Inferno?

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Será Que Um Deus Amoroso Puniria as Pessoas Para Sempre no Inferno?

Imagine-se segurar um fósforo aceso pela chama por apenas cinco segundos. O que aconteceria? É provável que, involuntariamente, você soltaria um grito e sofreria alguns dias pela dor da queimadura.

Talvez você já tenha visto alguma pessoa desfigurada por queimaduras sofridas num horrível acidente; a carne fica com cicatrizes disformes.  Imagine alguém andando entre chamas e como a sua carne ficaria queimada, por conta disso, ficando também desfigurada. Como seria este tipo de agonia por apenas um minuto? E por um ano? E pelo tempo de uma vida? E  para sempre?

A maioria das pessoas acha a ideia apavorante, quase inimaginável.  E ficariam aterrorizadas apenas se soubessem que alguém intenciona fazer isso com outra pessoa.

Por que, então, tantas pessoas estão dispostas a aceitar a ideia de que o Deus que adoram e de quem têm o mais elevado conceito iria querer infligir tal punição a inúmeras pessoas que morrem todos os dias? Qual é a possibilidade dessa crença se enquadrar na descrição que a Bíblia faz de Deus como sendo infinitamente bondoso e misericordioso?

Mas qual é a verdade sobre o inferno?

O inferno através dos séculos

O tradicional conceito de inferno como punição em um caldeirão de fogo tem sido ensinado por séculos. Talvez um dos primeiros a expor esse ponto de vista entre os cristãos foi o teólogo católico Tertuliano, que viveu por volta do ano 160-225 d.C. No terceiro século Cipriano de Cartago também escreveu; “O condenado será queimado para sempre no inferno; chamas devoradoras serão a sua recompensa. Os seus tormentos nunca serão atenuados e nem terão fim” (Peter Toon, O Céu e o Inferno: Uma Perspectiva Bíblica e Teológica [Heaven and Hell: A Biblical Theological Overview], 1968, p. 163).

Este ponto de vista tem sido reiterado oficialmente por muitos séculos. Um documento do Concílio de Constantinopla [atual Istambul], datado de 543 d.C., declara: “Todo aquele que diz que a punição dos demônios e dos infiéis não será eterna . . . seja anátema” (D.P. Walker, O Declínio do Inferno: Discussões Sobre o Tormento Eterno no Século Dezessete [The Decline of Hell: Seventeenth-Century Discussions of Eternal Torment], 1964, p. 21).

O Concílio da Igreja em Latrão (1215 d.C.) reafirmou a crença da eterna punição nestes termos: “O condenado irá para a condenação eterna com o diabo” (Toon, p. 164). Na Confissão de Augsburgo de 1530 se lê o seguinte: “Cristo retornará . . . para dar vida eterna e felicidade interminável aos crentes e eleitos, mas também para condenar os homens ímpios e os demônios ao inferno e ao castigo eterno” (Tonn, p. 131).

Através dos séculos, os ensinamentos sobre o tema acerca do inferno não têm sido consistentes em significado. As crenças sobre o inferno têm variado muito, dependendo das ideias do teólogo ou historiador eclesiástico que o interpretava. De modo geral, a crença mais comum tem sido aquela em que o inferno é um lugar onde as pessoas são torturadas por chamas constantes e eternas, mas nunca consumidas.

A localização do Inferno tem sido um assunto muito discutido. Alguns acreditavam ser no sol. Durante séculos, a opinião comum era de que o inferno estava no centro da terra em uma grande câmara subterrânea.

A mais vívida descrição de inferno como um lugar assim, como as pessoas geralmente creem, não tem fundamento na Bíblia e sim na obra A Divina Comédia, escrita pelo poeta Italiano do século quatorze, Dante Alighieri. Na primeira parte deste trabalho, intitulada de “O Inferno”, Dante descreve uma viagem imaginária por um inferno cheio de sofrimentos no fogo.

A interpretação mais moderna rejeita a ideia de tormento físico e afirma que as torturas do inferno é a angústia mental causada pela separação de Deus. Uma pesquisa recente sobre atitudes modernas revelou que 53% dos norte-americanos creem nesta perspectiva (Notícias dos Estados Unidos e Reportagens Mundiais [U.S. News and World Report], 31 de janeiro de 2000, p. 47).

O Papa João Paulo II “declarou que o inferno ‘não é uma punição exterior imposta por Deus’, mas é uma consequência natural da escolha do pecador impenitente de viver longe de Deus” (ibid., p. 48). Ainda, outras pessoas rejeitam definitivamente a doutrina sobre o inferno e acreditam que todos serão salvos.

Por que vemos tanto tipo de crenças sobre o inferno? Como a crença na imortalidade da alma, os equívocos comuns sobre o inferno estão repletos de ideias humanas, em vez de se basearem nos ensinamentos da Bíblia.

O conceito popular de inferno é uma mistura de pequenos trechos da verdade bíblica, combinadas com ideias pagãs e da imaginação humana. Como veremos a seguir, isso gerou uma representação grosseira e imprecisa sobre o que acontece com os ímpios após a morte.

Um Deus irado

Uma das descrições ilustrativas mais veementes dos tormentos do inferno concebido por homens veio do pastor puritano Jonathan Edwards, em um sermão dado em 1741, sob o título ‘Pecadores nas Mãos de um Deus irado’.

Ele disse: “O arco da ira de Deus está tenso e a flecha preparada . . . [por] um Deus revoltado . . . Apenas Sua mera complacência é que impede de vocês serem engolidos, neste momento, pela destruição eterna! O Deus que lhes segura sobre o abismo do inferno, como se segura uma aranha ou algum inseto repugnante sobre o fogo, Ele está muito aborrecido com vocês e está terrivelmente irritado: A Sua cólera contra vocês arde como fogo; Ele os vê apenas como merecedores de serem lançados no fogo . . .

“Vocês são dez mil vezes mais abomináveis aos Seus olhos do que a mais detestável serpente venenosa é aos nossos olhos. Vocês Lhe ofenderam  . . . e, contudo nada senão a Sua mão O impede de deixá-los cair no fogo a qualquer momento . . .

“Ó pecador! Considera o terrível perigo em que você está: é uma grande fornalha de ira, um imenso abismo sem fundo, cheio de fogo de cólera, sobre o qual você está suspenso pela mão de Deus . . . Você está suspenso por um delgado fio, com as chamas da cólera divina flamejando ao teu redor e prontas para lhe chamuscar a qualquer momento e depois queimá-lo completamente”.

Este conceito humano e essa descrição de inferno são tão terríveis que a perspectiva de tal destino causou grande angústia, medo e ansiedade em muitos puritanos. “A ênfase exagerada sobre o inferno e a condenação combinada com o excessivo autoexame levou muitos a um estado clínico de depressão: o suicídio parecia ser algo comum entre eles” (Karen Armstrong, Uma história de Deus [A History of God], 1993, p. 284).

Os puritanos não foram os únicos atormentados com o medo do inferno; muitas pessoas têm sido aterrorizadas por isso desde que este conceito antibíblico foi introduzido no ensinamento religioso. Outros pastores e doutrinadores de várias correntes de pensamento, como Jonathan Edwards, têm usado métodos semelhantes para, com o amedrontamento, levar as pessoas à crença e à obediência.

Uma das razões porque este conceito de inferno tem sobrevivido é porque certos teólogos acreditam que esses ensinamentos dissuadem as pessoas de praticar o mal. “A ideia era que se o medo da condenação eterna fosse afastado, muitas pessoas agiriam sem qualquer restrição moral, e a sociedade entraria em colapso e na imoralidade anárquica” (Walker, p. 4).

Um Deus misericordioso torturaria pessoas para sempre?

Seria possível conciliar a ideia de um Deus que aterroriza as pessoas pelo medo do tormento eterno no inferno com o Deus compassivo e misericordioso que encontramos na Bíblia?

Deus é um Deus de amor que não quer que ninguém se perca (2 Pedro 3:9). Ele nos diz para amar os nossos inimigos (Mateus 5:44). “Porque faz com que o seu sol se levante sobre maus e bons e a chuva desça sobre justos e injustos” (Mateus 5:45). No entanto, a visão tradicional do inferno quer nos fazer acreditar que um Deus vingativo atormenta as pessoas más por toda a eternidade—não apenas por décadas ou séculos, mas por um período infinito de tempo.

A ideia de que Deus sentencia as pessoas a uma punição eterna é tão repulsiva que tem afastado certas pessoas de crer em Deus e no cristianismo.

Um exemplo típico é Charles Darwin, que escreveu na sua autobiografia: “Assim, a descrença se apoderou de mim a um ritmo lento e progressivo até finalmente tomar de mim . . . Realmente não consigo entender como alguém possa querer que o cristianismo seja verdade; porque se fosse verdade, a clara linguagem do texto parece mostrar que aqueles que não acreditam . . . serão punidos por toda a eternidade. E esta é uma doutrina condenável” (Paul  Martin, A Mente Cura: As Ligações Vitais Entre o Cérebro, o Comportamento, a Imunidade e a Doença [The Healing Mind: The Vital Links Between Brain and Behavior, Immunity and Disease], 1997, p. 327).

A verdade é que a Bíblia não ensina esta ‘doutrina condenável’, mas o problema reside no fato de os homens terem mal-entendido o que diz a Bíblia.

Outros aspectos da doutrina tradicional acerca do inferno constituem uma ofensa ao bom senso. Uma dessas crenças sustenta que os justos, que são salvos, vão poder presenciar os tormentos infligidos aos ímpios. “Parte da felicidade dos bem-aventurados consiste em contemplar o sofrimento dos condenados. Este vislumbre vai lhes trazer alegria porque é a manifestação do ódio e da justiça de Deus ao pecado; mas, principalmente, porque estabelece um contraste que ressalta a compreensão do seu próprio estado de felicidade” (Walker, p. 29).

Sobretudo, este cenário é revoltante por várias razões. De acordo com esse raciocínio distorcido, os pais irão inevitavelmente assistir ao sofrimento de seus próprios filhos e vice-versa. Os cônjuges teriam que ver seus parceiros, marido ou esposa, incrédulos sofrendo uma tortura eterna. O pior de tudo é que esta doutrina retrata Deus como um Ser sádico e cruel.

Aqueles que insistem que a Bíblia ensina o tormento eterno pelo fogo devem se perguntar se tal crença é coerente com o que a Bíblia ensina sobre Deus. Por exemplo, como Deus poderia lidar de forma justa com aqueles que viveram e morreram sem nunca terem recebido uma oportunidade de salvação? Isso inclui os milhões que morreram quando recém-nascidos, assim como outros milhões de incrédulos ou idólatras que viveram e morreram sem nunca conhecerem a Deus ou a Seu Filho. Infelizmente, a grande maioria de todos os que já viveram se enquadra nesta categoria.

Alguns teólogos, tentando contornar esta dificuldade, supõem que aqueles que nunca tiveram a oportunidade de conhecer a Deus ou de ouvir o nome de Jesus Cristo receberão um tipo de passe livre. A justificativa é que desde que o seu estado de ignorância seja devido a circunstâncias alheias à sua vontade, Deus irá aceitá-los no céu, independentemente de sua falta de arrependimento. Se isso for verdade, isso suscita uma possibilidade preocupante —que os esforços missionários a essas áreas possa ser a causa de pessoas serem perdidas se não aceitarem seus ensinamentos!

Dilemas como este têm colocado muitos teólogos e outros cristãos contra a parede. Assim, alguns têm desafiado o conceito tradicional de um inferno de tormento eterno através dos séculos. “Em cada geração, as pessoas continuam questionando a crença ortodoxa do tormento eterno consciente”  (Quatro Visões do Inferno, William Crockett, editor, 1996, p. 140 [Four Views on Hell, William Crockett]).

No entanto, como vimos, os concílios da Igreja através dos tempos têm sustentado a doutrina. Firmemente enraizada na crença cristã tradicional, esta é uma ideia que não vai desaparecer assim tão fácil. O jornal Notícias dos Estados Unidos e Reportagens Mundiais [U.S. News and World Report], não muito tempo atrás, fez uma enquete e demonstrou que os norte-americanos acreditam mais no inferno hoje do que na década de cinquenta ou até mesmo na de oitenta e começo da de noventa  (31 de janeiro de 2000, p. 46).

A perspectiva sobre o inferno continuará assombrando as pessoas. Como concluiu o jornal Notícias dos Estados Unidos e Reportagens Mundiais  [U.S. News and World Report]: “As poderosas imagens do inferno, sem dúvida, continuarão pairando sobre a humanidade, como o têm feito por mais de dois mil anos, como uma lembrança sombria e ameaçadora da realidade do mal e de suas consequências”.

Há mais de um inferno na Bíblia

Qual é a verdade sobre o inferno? O que ensina a Bíblia? Muitas pessoas ficarão surpresas ao aprenderem que as Escrituras falam de três infernos— mas não no sentido em que a maioria acredita. Examinemos porque há tanta confusão acerca desse tema.

Nos original hebraico e grego, línguas em que a Bíblia foi escrita, nós encontramos quatro palavras, uma hebraica e três gregas, que são traduzidas como ‘inferno’ na Bíblia de língua portuguesa. Estas quatro palavras exprimem três significados diferentes.

A sepultura: Sheol no Antigo Testamento ou hades no Novo Testamento

A palavra Hebraica sheol, usada no Antigo Testamento, tem o mesmo significado que hades, uma das palavras gregas usadas para ‘inferno’ no Novo Testamento.

O Dicionário Bíblico Anchor [Anchor Bible Dictionary] explica o significado de ambas as palavras: “A palavra grega hades . . . algumas vezes, é traduzida erroneamente como “inferno” nas versões portuguesas do Novo Testamento. Mas, ela se refere ao lugar dos mortos [a sepultura] . . . O antigo conceito hebreu do lugar dos mortos, frequentemente chamado de sheol . . . geralmente é traduzido como hades, e esta palavra grega era de uso comum e corrente dos Judeus que escreviam em grego” (1992, vol. 3, p. 14, ‘hades, inferno’).

Ambas as palavras, sheol e hades, se referem simplesmente à sepultura. A comparação de uma escritura do Velho Testamento com uma do Novo Testamento confirma isto. No Salmo 16:10 lemos: “Pois não deixarás a minha alma no inferno [sheol], nem permitirás que o teu Santo veja corrupção” (versão de João Ferreira de Almeida, Revista e Corrigida [ARC]—a versão Revista e Atualizada [ARA] usa a palavra ‘morte’). Em Atos 2:27, o apóstolo Pedro citou este versículo e explicou que era uma referência a Jesus. Aqui, em Atos 2:27, na versão Revista e Corrigida, a palavra grega hades substitui a palavra hebraica sheol.

Para onde foi Jesus quando morreu? Seu espírito voltou para Deus (Lucas 23:46; ver “O Espírito no Homem” na página 11). Seu corpo foi colocado numa sepultura, que pertencia a José de Arimateia. As duas passagens, em Salmos e Atos, nos dizem que o corpo de Jesus não entrou em estado de decomposição na sepultura porque Deus o ressuscitou.

Na maioria das vezes que lemos nas Escrituras a palavra inferno, esta se refere simplesmente à sepultura, o lugar para onde vão todos quando morrem, quer sejam bons ou maus.

A palavra sheol é usada 65 vezes no Antigo Testamento. Na tradução Portuguesa de João Ferreira de Almeida Revista e Corrigida [ARC], ela é traduzida 28 vezes como inferno; como sepultura 27 vezes; cinco vezes como sepulcro e duas vezes simplesmente é transliterada como sheol; também a cada uma vez é convertida como terra, mundo invisível e sepultado.

A palavra hades é usada onze vezes no Novo Testamento. Na tradução Portuguesa de João Ferreira de Almeida Revista e Corrigida [ARC] encontramos esta palavra sendo usada três vezes na sua forma original de hades (Lucas 16:23; Atos 2:27 e 31), e oito vezes é traduzida como inferno (Mateus 11:23 e 16:18; Lucas 10:15; 1 Cor 15:55; Apocalipse 1:18; 6:8 e 20:13 e 14).

Uma palavra para prisão de demônios: Tártaro

A segunda palavra grega, tártaro, também é traduzida como “inferno” no Novo Testamento. Esta palavra é usada apenas uma vez na Bíblia (2 Pedro 2:4), onde se refere à restrição atual ou a prisão dos anjos caídos, também conhecidos como demônios.

O Dicionário Expositivo de Palavras da Bíblia [The Expository Dictionary of Bible Words] explica que tártaro significa “ficar confinado em tártaro” e que “tártaro era o nome grego para o abismo mitológico onde eram confinados os deuses rebeldes” (Lawrence Richards, 1985, “Céu e Inferno”, p. 337).

Pedro fez esta referência à mitologia contemporânea para mostrar que os anjos que pecaram foram “entregues às cadeias da escuridão, ficando reservados para o juízo”. Os anjos caídos estão numa condição ou lugar de restrição aguardando o julgamento final por sua rebelião contra Deus e por causa de sua influência destrutiva sobre a humanidade.

O lugar onde eles estão presos não é um submundo de fogo ou escuridão. Em vez disso, esse lugar de confinamento é na Terra, onde eles exercem influência sobre as nações e sobre as pessoas. Os Evangelhos registram que Jesus Cristo e seus apóstolos tiveram encontros reais com Satanás e seus demônios (Mateus 4:1-11; 8:16, 28-33, 9:32-33, João 13:26-27). Jesus mesmo se refere a Satanás como o príncipe deste mundo (João 12:31; 14:30, 16:11).

O termo tártaro aplica-se unicamente em relação aos demônios. Nunca se refere a um inferno em chamas onde as pessoas são punidas depois da morte.

Outra palavra com significado de queimar – isto é, pegar fogo: Gehena

Apenas na última palavra grega restante, gehena, traduzida como “inferno”, é que vemos alguns elementos em que as pessoas normalmente associam com a visão tradicional do inferno—mas não na forma de inferno retratada na imaginação das pessoas.

O termo gehena se refere a um vale nos arredores de Jerusalém. A palavra é derivada do hebraico gai-hinom, o Vale de Hinom (Josué 18:16). “Era um lugar de prática religiosa, onde se realizava sacrifícios humanos idólatras . . . Com intuito de acabar com estas abominações, [o rei de Judá] Josias o profanou com ossos humanos e outras resíduos (2 Reis 23:10, 13, 14)” (O Dicionário Completo de Estudo de Palavras do Novo Testamento [Spiros Zodhiates, The Complete Word Study Dictionary New Testament], 1992, p. 360).

Na época de Jesus, este vale era o que poderíamos chamar de lixão da cidade—o lugar onde todo o lixo era jogado e consumido pelo fogo, que lá ardia constantemente. As carcaças de animais de mortos—e corpos de criminosos desprezíveis—também eram lançados no gehena para serem completamente queimados.

Portanto, Jesus se utiliza desse local em particular e o que acontecia lá para ajudar seus ouvintes a entenderem claramente o destino que os injustos sofrerão no futuro. Assim, eles entenderiam facilmente o que Ele  queria dizer.

Existem vermes imortais no inferno?

Em Marcos 9:47-48, por exemplo, Jesus se refere especificamente ao gehena e ao que acontecia lá. Mas sem um conhecimento adequado da história daquele lugar, muitas pessoas chegam a conclusões erradas.

Preste atenção às Suas palavras: “Melhor é para ti entrares no Reino de Deus com um só olho do que, tendo dois olhos, ser lançado no fogo do inferno [gehena], onde o seu bicho não morre, e o fogo nunca se apaga”. Qualquer morador de Jerusalém teria entendido imediatamente o significado destas palavras de Jesus, pois gehena—o Vale de Hinom—estava ao sul nos arredores dos muros da cidade.

Sem entender isto, as pessoas, frequentemente caem em ideias erradas sobre este versículo. Algumas acreditam que “bicho” é uma referência à angústia de consciência que os condenados sofrem no inferno. “‘O seu bicho que não morre’ quase sempre era interpretado, figurativamente, como significando o tormento do remorso e da inveja” (Walker, p. 61). Muitos acreditam que a expressão “o fogo nunca se apaga” é uma alusão às constantes chamas do fogo que torturam o condenado.

Notavelmente, esta escritura tem sido interpretada fora de contexto. Observe que a frase “o seu bicho não morre, e o fogo nunca se apaga” devia aparecer entre aspas, porque é uma citação que Jesus fez de Isaías 66:24.  O entendimento correto de Sua declaração começa nesta passagem de Isaías.

O contexto em Isaías refere-se ao tempo do qual Deus diz: “Virá toda a carne a adorar perante Mim, diz o senhor” (versículo 23). É um tempo em que os iníquos já não existem mais. O que aconteceu com eles? No versículo 24 lemos que as pessoas “sairão e verão os corpos mortos dos homens que prevaricaram contra Mim; porque o seu verme nunca morrerá, nem o seu fogo se apagará; e serão um horror para toda a carne”.

Observe que Jesus citou um texto das Escrituras onde se diz que estavam mortos os corpos das pessoas afetadas pelos bichos. Obviamente, não se trata de pessoas vivas sofrendo no fogo. Quando Jesus retornar, lutará contra os que Lhe resistirem (Apocalipse 19:11-15). Aqueles que tombarem nessa batalha não serão enterrados, antes os seus corpos serão deixados no chão onde as aves de rapina e os vermes consumirão a sua carne.

Conforme o Livro Teológico de Palavras do Velho Testamento [Theological Wordbook of the Old Testament, 1980], a palavra hebraica original traduzida como “verme” em Isaías 66:24 e “bicho” em Marcos 9:47-48 significa “gusano, verme [ou] larva”.

Nem Isaías nem Cristo estão falando de vermes imortais. Os vermes de que eles falam não morreriam enquanto larvas porque, sustentadas pela carne que comiam, eles viveriam para se transformar em moscas. Então, as moscas põem ovos que eclodem em mais larvas (larvas de moscas), perpetuando o ciclo até que não haja mais nada para eles consumirem.

A informação por trás disso nos ajuda a entender melhor as palavras de Jesus. Naquele tempo, quando os corpos de animais mortos ou de criminosos executados eram lançados no lixo ardente do gehena; aqueles corpos eram destruídos pelos vermes ou pelo fogo que ardia permanentemente ali ou por ambos. Historicamente, um corpo que não fosse enterrado, mas que fosse submetido às chamas, era tido como amaldiçoado (Josué 6:18; 7:11, 25).

Então, o que significam as palavras de Jesus em Marcos 9:48 quando diz: “o fogo nunca se apaga”? Com a explicação anterior podemos entender isso. Ele simplesmente disse que o fogo sempre arderia enquanto houvesse corpos de iníquos condenados a serem consumidos. Esta expressão usada com alguma frequência nas Escrituras refere-se ao fogo que a tudo consome (Ezequiel 20:47). Um fogo inextinguível é aquele que ainda não foi apagado. Portanto, ele vai se extinguir por si só, quando tiver consumido toda a matéria que o alimenta e quando não houver mais material combustível.

Quando os ímpios serão punidos?

Certamente, podemos perguntar quando ocorrerá essa punição?

Como vimos antes, Jesus citou o profeta Isaías, quem escreveu acerca do que acontecerá depois que o Messias estabelecer o Seu reino na Terra. Somente então toda a humanidade virá para “adorar perante Mim” (Isaías 66:23). Somente então é que esta profecia será cumprida.

Jesus usa um local comum, em Sua época, de despejo de lixo—o lixão do Vale de Hinom, que ficava fora dos muros de Jerusalém—para ilustrar o destino final dos ímpios em que as Escrituras chamam de lago de fogo. Assim como o lixo da cidade era consumido pelas larvas e pelo fogo também os ímpios serão queimados—consumidos—no futuro fogo do gehena depois de mil anos da volta de Cristo (Apocalipse 20:7-9, 12-15).

Pedro explica que naquele tempo “os céus passarão com grande estrondo, e os elementos, ardendo, se desfarão, e a terra e as obras que nela há se queimarão” (2 Pedro 3:10). A implicação é que a superfície da Terra se tornará como uma massa fundida, destruindo qualquer evidência da impiedade humana.

O que acontecerá depois disto? O apóstolo João escreveu: “E vi um novo céu e uma nova terra. Porque já o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe” (Apocalipse 21:1). Toda a Terra será transformada numa habitação digna para os justos que, nesse tempo futuro, terão herdado a vida eterna.

A destruição da alma e do corpo no inferno

Outra passagem onde Jesus fala do fogo do gehena está em Mateus 10:28: “E não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei antes aquele que pode fazer perecer no inferno [gehena] a alma e o corpo”  (Mateus 10:28).

Devemos observar que Jesus não fala de pessoas que sofrem um tormento eterno. Ele diz que Deus pode destruir—aniquilar—o corpo e a alma no fogo do gehena. (Para saber mais, ver “Alguma passagem da Bíblia ensina que temos uma alma imortal?”, a partir da página 12).

Jesus aqui explica que, quando um homem mata outro, o resultado da morte é apenas temporário porque Deus pode trazê-lo à vida outra vez. Mas, quando Deus destrói alguém no inferno (gehena), o resultado desta morte é eterno. Não há ressurreição neste caso e isso a Bíblia chama de  “segunda morte”.

A Bíblia diz que os pecadores impenitentes serão jogados no lago de fogo, ou gehena, no final dos tempos. “Mas, quanto aos tímidos, e aos incrédulos, e aos abomináveis, e aos homicidas, e aos fornicadores, e aos feiticeiros, e aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre, que é a segunda morte” (Apocalipse 21:8).

Esta passagem e outras semelhantes demonstram que a doutrina da salvação universal é falsa. Nem todos serão salvos. No fim, alguns vão se recusar a arrepender-se e vão sofrer a punição. Mas esta punição não será queimar em um fogo que nunca se apaga. Pelo contrário, é passar por uma morte da qual não haverá ressurreição.

Como esclarecemos anteriormente, os iníquos serão destruídos. Eles não viverão eternamente noutro lugar ou num estado de angústia eterna. Eles serão destruídos no lago de fogo no fim dos séculos. Eles serão consumidos quase instantaneamente pelo calor do fogo e nunca mais voltarão a viver  de novo.

O ímpio reduzido a cinzas

Outra passagem que ilustra graficamente a destruição total dos ímpios se encontra em Malaquias 4:1: “Pois certamente vem o dia, ardente como uma fornalha. Todos os arrogantes e todos os malfeitores serão como palha, e aquele dia, que está chegando, ateará fogo neles”, diz o Senhor dos Exércitos. ‘Não sobrará raiz ou galho algum’” (NVI).

Isto ocorrerá no fim dos tempos, quando Deus retribuirá aos iníquos por causa de seu caminho de vida rebelde e repreensível. Mas para aqueles que se submetem e obedecem a Deus, Ele diz: “E pisareis os ímpios, porque se farão cinza debaixo das plantas de vossos pés, naquele dia que farei, diz o Senhor dos Exércitos” (versículo 3).

Deus, falando através do profeta Malaquias, deixa claro qual é o destino final dos ímpios. Eles serão arrancados como árvores infrutuosas, sem deixar raiz nem ramo. Eles serão consumidos pelas chamas do lago de fogo e restarão apenas cinzas.

A Bíblia ensina que os ímpios serão punidos no fogo—mas não no inferno mítico da imaginação dos homens. Deus é um Deus de misericórdia e de amor. Aqueles que voluntariamente escolherem rejeitar Seu caminho de vida, caracterizada pela obediência à Sua lei de amor (Romanos 13:10), vão morrer, mas não sofrer para sempre. Eles serão consumidos pelo fogo e esquecidos. Eles não serão torturados por toda a eternidade.

Lembre-se de que a vida eterna é algo que Deus deve conceder, e Ele apenas irá concedê-la para aqueles que se arrependam e sigam-No—e não àqueles que persistem na rebelião contra Ele.

Compreenda que a morte final das pessoas incorrigíveis e perversas em um lago de fogo é um ato não apenas de justiça, mas também de misericórdia da parte de Deus. Permitir que elas continuassem a viver impiamente, em eterna rebelião, causaria grande tristeza e angústia a si mesmas e a outras pessoas. Deus não vai deixar que isso aconteça muito menos entregá-las a um tormento insuportável por toda a eternidade.

A alentadora verdade da Bíblia nos mostra que Deus é realmente um Ser de grande misericórdia, sabedoria, e juízos justos. Tal como lemos no Salmo 19:9: “Os juízos do senhor são verdadeiros e justos juntamente”.