No versículo 25 do capítulo 30 começa uma história peculiar que poucos parecem entender. Contudo, compreender o raciocínio de Jacó quanto ao estranho acordo que ele fez Labão pode nos ajudar a perceber melhor o desenvolvimento de seu caráter.

Jacó serviu Labão por quatorze anos. Agora ele desejava partir e voltar para seu pai em Canaã. Entretanto, Labão queria muito que Jacó ficasse em sua casa, pois Deus abençoava tudo o que Jacó fazia, e assim Labão ficou rico. “Determina-me o teu salário, que to darei”, disse Labão (versículo 28), tentando convencer Jacó a ficar. “Nada me darás”, respondeu Jacó. Essa resposta dele é essencial para entender tudo, pois uma leitura desatenta da história pode fazer parecer que Jacó separou os animas listrados e malhados do rebanho de Labão como seu pagamento. Mas não foi isso que aconteceu. Jacó separou os animais listrados e malhados e os entregou a Labão, cujos filhos os levaram a uma distância de três dias de viagem (versículo 36). Então, Jacó ficou apenas com os animais brancos.

Na última parte do versículo 32, Jacó não estava dizendo que as ovelhas malhadas e listradas, que ele apartou do rebanho, seriam seu salário. Em vez disso, as palavras de Jacó foram: “Nada me darás”. Os animais listrados e malhados foram entregues aos filhos de Labão, que os levaram embora. Na verdade, Jacó estava dizendo que no futuro qualquer animal listrado e malhado nascido no rebanho que ele cuidasse seria seu salário. Aos olhos de Labão isso seria impossível de acontecer, pois Jacó ficaria apenas com os animais brancos! Como animais de cor branca podiam gerar animais de cores listradas e malhadas? Por causa disso Labão concordou imediatamente com a proposta: “Tomara que seja conforme a tua palavra” (versículo 34).

Agora, ainda mais importante é o início do versículo 33. “Assim, testificará por mim a minha justiça no dia de amanhã, quando vieres e o meu salário estiver diante de tua face…”. Esta declaração reveladora marca um avanço profundo no desenvolvimento do caráter de Jacó. Quando Jacó chegou a Padã-Arã, ele era um manipulador ganancioso que confiava em suas próprias habilidades e artimanhas para conseguir o que queria. Porém, esse período de quatorze anos servindo a Labão — durante os quais Labão sempre o enganou, mas Deus sempre o abençoava em tudo o que fazia — causaram uma transformação em Jacó. Ele havia progredido a ponto de demonstrar uma conduta justa por agora acreditar que Deus lhe daria bênçãos e prosperidade. Sem dúvida, essa foi uma significativa mudança de coração e um grande avanço em direção a um caráter justo!

O versículo 37 começa com algo igualmente estranho sobre galhos de álamo, aveleira e castanheiro. Muitos comentaristas sugerem o uso de algum tipo de mágica ou que aquelas varas descascadas tinham a intenção de fazer com que as ovelhas imitassem as listras das varas e dessem à luz a animais listrados. Mas é obvio que Jacó não estava envolvido com nenhum tipo de magia. Atente para o versículo 38: “E pôs estas varas, que tinha descascado, em frente do rebanho, nos canos e nas pias de água, aonde o rebanho vinha a beber, e conceberam vindo a beber”. A palavra “conceber” é traduzida do hebraico yacham, que significa literalmente “estar com calor”, e que, tratando-se de animais, pode significar “estar no cio”.

Ao descascar essas varas verdes (versículo 37), Jacó fez com que a seiva delas ficasse exposta, provavelmente misturando-a na água dos bebedouros. Talvez ele acreditasse que esse aditivo na água ajudaria a aquecer os animais. Também se sugeriu que as varas descascadas foram usadas como uma espécie de cerca de curral, montada quando os rebanhos vinham beber para mantê-los juntos por mais tempo para o acasalamento. Os versículos 41-42 também nos informam que Jacó praticava a reprodução seletiva, garantindo que os melhores animais do rebanho se sujeitassem a esse tratamento da água.

Mas nada disso surtiu o efeito que Jacó desejava. Essas ações apenas o ajudaram a selecionar quais ovelhas se reproduziriam naquele momento. Então, foi Deus quem provocou essa coloração incomum das ovelhas. Como disse Jacó: “testificará por mim a minha justiça”. A reprodução de ovelhas listradas foi a resposta de Deus à justiça de Jacó. E, de fato, mais tarde vemos que Labão, ao ver os resultados, continuou mudando o acordo sobre quais ovelhas Jacó receberia — e, em todos os casos, Deus continuou beneficiando a Jacó. Ademais, Jacó explicou a suas esposas: “Deus não lhe permitiu que (Labão) me fizesse mal. Quando ele dizia assim: Os salpicados serão o teu salário, então, todos os rebanhos davam salpicados. E, quando ele dizia assim: Os listrados serão o teu salário, então, todos os rebanhos davam listrados. Assim, Deus tirou o gado de vosso pai e mo deu a mim” (Gênesis 31:7-9).

Enfim, Jacó amadureceu muitíssimo enquanto estava a serviço de Labão. Ele havia abandonado sua atitude gananciosa e manipuladora e entendeu que a prosperidade e a proteção dependem de uma conduta justa diante de Deus. E por isso, Deus o recompensou e o fez prosperar. Contudo, o caráter de Jacó precisava se desenvolver ainda mais.