Comentário Bíblico
Levítico 19
Partes desse capítulo parecem ter vindo do Novo Testamento. Na verdade, encontramos nele a declaração do Antigo Testamento sobre o segundo grande mandamento, conforme definido por Jesus Cristo (Levítico 19:18; comparar Mateus 22:37-40). O capítulo se inicia com uma asseveração clara acerca do propósito do que aconteceu antes e do que está por vir: Porque Deus é santo, assim também deve ser o Seu povo. Esse capítulo continuará com diversas leis elaboradas para manter um relacionamento santo com Deus e os homens.
As duas primeiras leis vão diretamente a uma necessidade fundamental para relacionamentos corretos: a reverência. A reverência é o grande respeito prestado por um indivíduo a outro, com atenção especial ao comportamento submisso. Deus ordena reverência aos pais, aos professores dos filhos, e à observância de todos os Seus sábados, que são ocasiões de ensinamento entre Ele, nosso Pai espiritual, e nós, Seus filhos. Deus ainda ordena reverência a Ele mesmo ao proibir novamente a idolatria. Quando os filhos reverenciam seus pais e Deus — atendendo às Suas instruções — surgem relacionamentos corretos baseados em respeito e honra mútuos e também uma multidão de bênçãos.
O regulamento referente às ofertas de paz (ou comunhão) aborda novamente o relacionamento entre Deus e Israel. Deus criou a paz e a comunhão entre Si mesmo e Israel, e essa comunhão, simbolizada pelas ofertas de paz, deve ser respeitada. Assim, as ofertas de paz não devem ser tratadas de forma banal apenas porque foram amplamente compartilhadas entre os membros da família. Então, era muito importante lembrar que, enquanto a família se banqueteava com aquela oferta, Deus também tinha Sua parte nisso e ceava com a família. Portanto, tendo um convidado tão honrado em comunhão, era preciso ter cuidado para garantir o decoro e o respeito.
As leis relativas às espigas podem não parecer uma questão de santidade, mas é, pois, como já mencionado, a ideia fundamental por trás da santidade é a separação. Aqui, Deus separa uma determinada porção de uma colheita para os pobres. Na verdade, essa porção era sagrada e reservada exclusivamente para eles. Contudo, observe que aqueles que recebiam essa porção reservada ainda tinham que trabalhar por ela. Ao contrário de muitos sistemas de assistência social modernos, os destinatários dessa generosidade de Deus ainda tinham que colher seu alimento nos campos e vinhedos. Isso condizia com o princípio bíblico que, mais tarde, Paulo expressou sucintamente: "Se alguém não quiser trabalhar, não coma também " (2 Tessalonicenses 3:10). A lei era justa para todos os envolvidos. Ela era generosa para com os pobres, mas também justa para com os donos das terras — já que Deus mesmo prometia abençoar suas colheitas se O obedecessem. Ao promulgar essa lei, Deus garantiu mantimentos para os carentes dentre Seu povo — e tornou todo Israel participante dessa provisão.
A atenção à verdade e à justiça é abordada de forma proeminente. Quando um povo se separa para a verdade e a justiça, ele é unificado e abençoado com a paz. A nação sacerdotal de Deus, Israel, precisava ser exatamente assim se quisesse servir de exemplo para o resto do mundo. Uma parte importante de fazer justiça é nunca permitir que seu irmão continue em pecado. Essa "tolerância" destruiria seu irmão e, eventualmente, sua comunidade e nação. Ter uma "mente aberta" ou um "grande coração" não tem nada a ver com tolerar a continuidade do pecado (comparar 1 Coríntios 5:1-2, 6) — isso é uma tolice perigosa para todos ao redor! Lembre-se de que o pecado afeta tudo. Então quando um irmão está pecando, devemos fazer um esforço para restaurá-lo espiritualmente (Gálatas 6:1-2) — com humildade, mas também com uma repreensão franca, se necessário (Provérbios 27:5).
E quase no fim do capítulo, Deus aborda temas sobre sangue, adivinhação e necromancia, cabelo, barbas, piercing corporal, tatuagens, prostituição e sábados. Por quê? O que tudo isso tem em comum? Muitas coisas. Tudo isso diz respeito a práticas pagãs. O consumo de sangue fazia parte do culto cananeu, assim como a necromancia e a adivinhação (isto é, predição baseada em práticas pagãs). O ato de raspar as laterais da cabeça se refere a certas tonsuras ou penteados repletos de simbolismo solar pagão (essa prática de tonsura era amplamente praticada pelo clero católico romano durante a Idade Média e das Trevas, e, até certo, ponto ainda é hoje). Aparar a barba de determinada forma também fazia parte do culto pagão. Os piercings corporais e tatuagens serviam para marcar uma pessoa como adoradora de um deus em particular, mas Deus deseja que O honremos e glorifiquemos apresentando nossos corpos limpos (1 Coríntios 6:20). E, como observado anteriormente, a prostituição ritual era uma característica onipresente da religião cananeia.