Comentário Bíblico
Deuteronômio 16:18-17:20
Justiça Para Todos
Nessa seção de Deuteronômio, Moisés explica como a justiça deve ser administrada — e quem deve fazer isso. Ele começa explicando que é preciso nomear juízes e oficiais em cada cidade. E se um assunto se mostrar muito complicado nessa instância jurídica, então isso deveria ser levado ao lugar do tabernáculo de Deus, ou seja, aos "sacerdotes levitas e ao juiz que houver naqueles dias", que, juntos, constituíam uma espécie de "tribunal supremo", cujas decisões eram vinculativas (Deuteronômio 17:9-11). Contudo, não era, por exemplo, como o Supremo Tribunal Federal do Brasil, uma corte de apelações em que qualquer um dos lados de uma disputa pode recorrer da ação que está sendo julgada — pois, nessa instância inferior, somente os juízes poderiam decidir se o caso poderia ser levado à instância superior. Mais tarde, o principal cargo de julgamento no nível humano seria ocupado por um rei. Ademais, nenhum desses juízes deveria perverter a justiça aceitando subornos ou sendo parciais (Deuteronômio 16:18-20).
Moisés continua alertando contra a idolatria e descrevendo os procedimentos corretos e justos acerca da execução de seus perpetradores — por apedrejamento (versículo 21-17:7). E para garantir que uma alegação de idolatria pudesse ser comprovada, o assunto tinha que ser investigado a fundo, e também era necessário haver duas ou três testemunhas para confirmar a transgressão. Mas se apenas uma pessoa visse e relatasse a transgressão, o acusado não poderia ser morto. Além disso, as testemunhas que denunciaram a transgressão é que iniciariam o apedrejamento (versículos 1-7). Por se tratar de nação carnal, esse procedimento tinha o intuito de garantir que a pessoa apedrejada fosse realmente culpada daquela transgressão e também para que essa maldade não voltasse a acontecer. Na verdade, esses mesmos princípios tinham que ser aplicados para qualquer crime capital (Números 35:30). Além disso, nenhuma condenação por crime, digno de morte ou não, poderia ser aplicada sem o testemunho de pelo menos duas testemunhas (Deuteronômio 19:15).
Depois de explicar o papel dos juízes nomeados e a responsabilidade do povo de ouvi-los, Deus passa para a questão da realeza humana. Naquela época, Deus era o Rei de Israel (Êxodo 15:18; Números 23:21). Mas conhecendo a natureza humana, Ele sabia que, eventualmente, Israel pediria um rei humano como em outras nações, apesar de isso significar uma rejeição ao governo direto de Deus e, portanto, algo pecaminoso (1 Samuel 8:7; 12:19). Aliás, como já estava profetizado, Deus daria um rei humano a eles (Gênesis 17:16; 49:10). Mas o futuro rei de Israel não seria como os outros governantes daquela época. Contudo, ao impor restrições e exigências ao rei de Israel, Deus praticamente decretou que a nação seria uma monarquia constitucional limitada por Sua teocracia suprema.
“Essas regras limitavam o poder e a grandeza do futuro rei. Ele não seria dependente de nenhum poderio militar e de riquezas. Ele era instado a não enredar a nação em alianças políticas, pois isso poderia expor o povo à adoração pagã. Em vez disso, ele deveria guiar a nação para a obediência às leis de Deus" (Bíblia de Estudo Thomas Nelson, nota sobre Deuteronômio 17:15-17). Ao exigir que o rei lesse e governasse de acordo com a lei de Deus, "o verdadeiro rei de Israel estaria vinculado às instruções de Deus. Ele não seria um tirano, mas um rei que governaria segundo a vontade revelada de Deus" (nota sobre Deuteronômio 17:18). Infelizmente, poucos reis israelitas cumpririam as suas responsabilidades nesses aspectos.
Todavia essas instruções também podem servir de lição para nós. Os verdadeiros cristãos, que vivem hoje suas vidas segundo a regras de Deus, não podem se envolver em julgamentos civis dos governos deste mundo (ver 2 Coríntios 3:6-7). Mas, um dia, eles vão servir como reis no vindouro Reino de Deus que, em breve, será estabelecido sobre toda a Terra (Apocalipse 5:10; 20:4, 20:6; 2:26-28). Daniel 7:18 diz que "os santos do Altíssimo receberão o reino e possuirão o reino para todo o sempre e de eternidade em eternidade". E o versículo 22 revela que "foi dado o juízo aos santos do Altíssimo; e chegou o tempo em que os santos possuíram o reino". E Salmos 149:5-9 relata: "Exultem os santos na glória, cantem de alegria no seu leito. Estejam na sua garganta os altos louvores de Deus e espada de dois fios, nas suas mãos, para tomarem vingança das nações e darem repreensões aos povos, para prenderem os seus reis com cadeias e os seus nobres, com grilhões de ferro; para fazerem neles o juízo escrito; esta honra, tê-la-ão todos os santos. Louvai ao SENHOR!".
Embora os cristãos não devam participar de julgamento nos governos do mundo atual, quando glorificados como reis imortais, eles julgarão as nações de acordo com o "juízo escrito". Portanto, se os reis de Israel tinham a responsabilidade de ler e meditar no Livro da Lei, os cristãos, como futuros reis do Reino de Deus, têm uma responsabilidade ainda maior de fazer isso — estudando não apenas a lei civil de Israel, mas todos os juízos de Deus espalhados por toda a Bíblia. Obviamente, os cristãos glorificados governarão com muita misericórdia — assim como a magnânima misericórdia de Deus foi demonstrada a eles durante suas vidas humanas.