Emoldurado Eternamente Por Uma Lágrima
A Bíblia é transmitida a nós por meio de palavras escritas, mas, muitas vezes, com uma descrição suficiente para, ao lê-la, formar poderosas e permanentes imagens mentais em nosso cérebro. E muitas dessas imagens nos vêm à mente quando congelamos várias imagens instantâneas do ministério terreno de Jesus Cristo, Aquele que, junto com Deus Pai, também era Deus e se fez carne, tornando-se um ser humano (João 1:1-3, 14).
Eu imagino uma imagem instantânea de Jesus, aos doze anos, ainda menino, em pé no pátio do templo de Jerusalém entre os velhos mestres, que estavam boquiabertos de espanto por causa do Seu entendimento das escrituras.
Uma das minhas imagens mentais favoritas é a de Jesus sorrindo com os membros da família enquanto celebram um casamento em Caná. Eu imagino uma imagem ampla de Jesus erguendo as mãos para o céu, abençoando os peixes e os pães trazidos diante dEle enquanto milhares de pessoas ansiosas o cercavam.
Imagino um Jesus zeloso e, com razão, revoltado derrubando várias vezes as mesas dos mercadores na área do templo. Eu me demoro e sorrio para a minha imagem mental de Jesus olhando para Pedro encharcado de água, após andar brevemente sobre a água, e trazendo-o de volta ao barco com um olhar consciente — de que no futuro o homem terá outro tipo de fé e não vai afundar.
Apenas duas palavras resumem tudo!
Mas a imagem que eu quero analisar com você não está apenas em minha mente, mas está alojada firmemente no âmago de meu ser. O que está encapsulado aqui nos capacita a continuar fielmente nessa jornada em resposta ao maior convite pessoal já oferecido à humanidade por nosso Mestre Jesus. Essa imagem se encontra no versículo mais curto da Escritura, João 11:35. O poder não vem da quantidade de palavras, mas do teor dessas palavras — sobre o momento captado! Apenas duas palavras: “Jesus chorou”.
Como no discurso de dois minutos do presidente dos Estados Unidos, Abraão Lincoln, na cidade de Gettysburg, que capta a abrangente essência do nascimento, morte e renascimento de uma nação despedaçada, nós somos convidados a contemplar e abraçar a essência do coração de Deus, revelado na emoção de Seu Filho, para sempre emoldurada por uma lágrima. Apenas duas palavras que resumem tudo! Uma lágrima viva que nunca se secará através do tempo, sendo lembrada por todas as gerações que atenderem ao grande convite Daquele que chorou.
O contexto desse cativante momento é a história da morte do querido amigo de Jesus, Lázaro de Betânia, na Judéia e seu encontro dramático com as irmãs de Lázaro, Maria e Marta, no caminho para o túmulo de Lázaro. Mas primeiro, vamos voltar à história antes do momento desse encontro naquele caminho poeirento rumo ao túmulo de Lázaro.
Alguns dias antes, Maria e Marta enviaram um mensageiro a Jesus informando a situação de seu irmão: “Senhor, eis que está enfermo aquele que Tu amas” (João 11:3). Ele declarou abertamente: “Esta enfermidade não é para morte, mas para glória de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por ela” (versículo 4, NVI).
Os versículos seguintes demonstram claramente o amor de Jesus por Marta e Maria. Mas esses mesmos versículos também nos dizem que Ele esperou mais dois dias para ir a Betânia. Por quê? Cristo disse a Seus discípulos: “Lázaro, o nosso amigo, dorme, mas vou despertá-lo do sono” (versículo 11, NVI) — querendo dizer que Lázaro havia morrido (versículo 14). Então, propositalmente, Ele esperou isso acontecer. E não era por causa de Sua própria segurança que Ele estava nos arredores de Jerusalém. Na verdade, como Filho de Deus, Ele tinha o poder de ver as coisas como já tivessem acontecido — assim Seu querido amigo seria ressuscitado dos mortos quando Ele chegasse para chamá-lo da sepultura.
Em seu devido tempo
Quando chegou o momento — no tempo de Deus — Jesus anunciou: “Vamos ter com ele” (versículo 15). Porém, Ele foi avisado, veementemente, para não ir. Isso parecia suicídio, pois os adversários estavam à espreita. Jesus sabia disso e também que ainda não era o tempo de ser morto. Ele também sabia que, assim como ressuscitaria esse homem para a vida, Sua própria morte seria a favor de todos e que Ele também ressuscitaria dos mortos para que todos pudessem ter vida. Um prenúncio do poder que Jesus recebera sobre a morte seria revelado através da ressurreição de Lázaro, que foi acometido dessa doença fatal, como vimos anteriormente, era “para glória de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por ela” (versículo 4).
Tudo dependia do tempo, e o Senhor do tempo estava ali trabalhando. Finalmente, Ele chegaria, aproximando-se dos arredores de Betânia, mas agora quatro dias após a morte de Seu amigo. Na cultura judaica daquele dia, o espaço de tempo de quatro dias soava “demasiadamente definitivo”.
Aquela situação parecia absolutamente sem retorno. Cristo estava caminhando rumo ao desespero absoluto e, talvez, até ao ressentimento. Mas os limites do homem são o início da oportunidade de Deus de virar a página. Conscientemente, Ele se move em direção ao primeiro assunto em questão: enfrentar as irmãs que haviam chamado Sua atenção e parecia ter sido ignoradas, especialmente nesse momento que a família mais precisava dEle.
Marta, sempre obediente, vai ao encontro de Jesus, apesar de estar sofrendo e abalada tremendamente: “Senhor, se Tu estivesses aqui, meu irmão não teria morrido” (versículo 21). No entanto, ela ainda acredita que Ele pode pedir a Deus que faça algo (versículo 22). Jesus responde: “Teu irmão há de ressuscitar” (versículo 23). Ele proclama ainda: “Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá; e todo aquele que vive e crê em Mim nunca morrerá. Crês tu isso?” (versículo 25). Marta responde: “Sim, Senhor, creio que Tu és o Cristo, o Filho de Deus, que havia de vir ao mundo” (versículo 27).
E logo Jesus foi falar com Maria que, em seu profundo pesar, tinha ficado em casa. Até dentro da família, todos nós reagimos ao sofrimento de maneiras diferentes. Então, Marta comunica a Maria que o amigo e mestre delas havia chegado. Maria sai ao encontro de Jesus, e uma multidão a segue, acreditando que ela estava indo chorar no túmulo de seu irmão (versículos 28-31). Então, a partir daqui é que a história se desenvolve em direção às lágrimas que serão derramadas.
Para Jesus, a declaração de Maria, que está caída aos Seus pés, ecoa na de Marta (versículo 32). Hoje em dia, esse mesmo pensamento pode agitar nossos corações quando as coisas não acontecem de acordo com nossos planos. Permita-me parafrasear: “Deus, onde você estava? Se... se...!”.
Em seu diálogo abrangente de fé, as irmãs estavam começando a entender que seu amigo e mestre não é um simples homem santo do vilarejo, mas o Filho de Deus que transcende o tempo e o espaço para tornar conhecida a vontade de Deus. E que, às vezes, Ele permite que até mesmo Seus amigos morram no presente para magnificar o propósito eterno de nosso Pai Celestial. Mas, novamente, Jesus, o Filho de Deus, está aqui também como o Filho do Homem — e Seu divino cuidado com a humanidade está prestes a ser demonstrado através daqueles que Ele ama.
“Vede como o amava”
Jesus olha para Maria que estava chorando, assim como aqueles que estão com ela (versículo 33). E não era um simples choro, mas um pranto desesperado, uma experiência agonizante de se ver, embora humanamente necessária. Lembre-se, Jesus está vivendo isso — não apenas de perto, mas pessoalmente. E, ao ver isso, Jesus “moveu-se muito em espírito e perturbou-se” (mesmo versículo).
Então, Ele pergunta: “Onde o pusestes?” Para confirmar a morte de Lázaro (versículo 34). Em seguida, o relato de João declara brevemente: “Jesus chorou” (versículo 35).
Antes de prosseguir, permita-me compartilhar o fato de que incontáveis sermões e páginas de comentários já foram escritos sobre a implicação dessas duas palavras. Alguns têm abrangentes explicações teológicas que vão desde Adão a Eva e muito além dos eventos aqui narrados. Certamente, pode ser razoável explorar esse assunto, mas devemos ver, cuidadosamente, no contexto a resposta óbvia do motivo de Jesus ter chorado.
Olhando para Ele, ali estava uma mulher, uma amiga querida, soluçando e caída a Seus pés numa estrada poeirenta. Marta também estava abalada. Todas as pessoas ali estavam chorando, tristes com a horrível tragédia da morte de Lázaro, e com a terrível sensação de perda e conflito pela qual a família estava passando.
Quando Ele chorou, a multidão ao Seu redor sentiu isso e comentou: “Vede como o amava”.
Mas, na verdade, eles não entenderam. Jesus não ficou triste por causa de Seu amigo Lázaro, nem por ter se atrasado, pois agora chegara com o propósito específico de chamá-lo de volta à vida. Jesus chorou por aqueles que estavam abalados e sofrendo. Ele sabia o que era perder um ente querido próximo. José, Seu pai adotivo, havia morrido algum tempo antes e Jesus entendia e tinha passado por uma perda semelhante a que os outros estavam passando agora.
Entretanto, Jesus sempre teve esperança e certeza no futuro. E, provavelmente, Ele também tenha chorado por causa da falta de compreensão sobre a morte, o plano de Deus e Sua própria missão entre aqueles que estavam de luto. Se soubessem, eles não estariam tão abalados. Portanto, foi doloroso para Ele ver isso. As pessoas poderiam ter concluído melhor seu pensamento, dizendo: "Veja como Ele ama Seus amigos — e todos nós".
O choro de Cristo revela que adoramos um Deus que se preocupa intimamente com a Sua criação. O Evangelho de João, escrito em grande parte para um público helenístico, contrasta, de forma simples e eloquente, o Deus do universo com o panteão de falsos deuses que nunca demonstrou empatia e emoção, que significa que eles não eram nem um pouco divinos.
E é aqui que nosso Pai Celestial é revelado por meio de Seu Filho, a quem o Pai enviou a nós para que, literalmente, o homem fosse tocado por Deus, que, por sua vez e através de Cristo, poderia ser tocado pelo homem. Afinal, o nome profetizado de Jesus é Emanuel, que significa "Deus conosco" (Mateus 1:23). Naquela estrada poeirenta de Betânia, o céu e a terra se uniriam por um momento para demonstrar a compaixão daquele que era Deus e Homem — Alguém que podia ser dominado pelo Seu amor aos amigos e aos outros que estavam sofrendo. E isso também representou o amor do Pai.
E aqui essa lágrima resumia tudo. E isso não tornaria Jesus menos infalível, mas o fato de esse momento ter sido eternamente emoldurado por uma lágrima o torna incrível e indispensável. Aqui o amor de Deus por nós foi demonstrado na carne.
Hoje, à destra de Deus, temos um Salvador e Sumo Sacerdote que pode “compadecer-se das nossas fraquezas” (Hebreus 4:15) e, também posso acrescentar, de nossa humanidade — de nossas mágoas, de nossos anseios e até de nosso desespero pela dor da separação dos entes queridos. E, nesse mesmo espírito, o apóstolo Paulo, talvez lembrando o exemplo de Cristo, nos encorajou a chorar “com os que choram" (Romanos 12:15). Isso também faz parte do convite de seguir a Cristo.
“Deus enxugará toda lágrima”
A última imagem instantânea da oferta da grande esperança da eternidade se encontra em Apocalipse 21:4: “E Deus limpará de seus olhos toda lágrima, e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor, porque já as primeiras coisas são passadas”.
Novamente, as palavras expressam uma incrível intimidade ao descrever o toque pessoal de Deus em enxugar as lágrimas. Cristo já demonstrou com Suas próprias lágrimas em Betânia, e agora nosso Pai Celestial se envolve com ternura. Em última análise, esse é o lugar onde o maior convite já oferecido à humanidade de seguir a Cristo alcança seu auge e vemos o amor de Deus emoldurado para sempre numa lágrima.
À medida que avançamos nessa grande peregrinação diante de nós, devemos sempre nos lembrar de nos manter firmes na realidade de que Deus quer que você esteja presente nessa última fotografia de família!