O Cristianismo 101
Perdoar & Ser Perdoado
Dois irmãos foram até o rabino deles para resolverem uma antiga disputa. O rabino conseguiu que os dois resolvessem suas diferenças e apertassem as mãos. Quando estavam prestes a sair, ele pediu a cada um para fazer um desejo para o outro em homenagem ao Ano Novo Judaico (uma época de novos começos). Um virou-se para o outro e disse: "Eu lhe desejo o mesmo que desejar para mim". Com isso, o outro irmão ergueu as mãos e disse: "Olha, rabino, ele está começando de novo!".
Esta história levanta uma questão intrigante: Por que é tão fácil perceber um espírito rancoroso nos outros e não em nós mesmos? E isso leva a outra questão importante: Que tipo de perdão que você tem para oferecer, parcial ou completo, ou não perdoa nada?
Precisamos entender que diariamente convivemos com os resultados de nossas decisões de perdoar ou não perdoar. Nosso desejo (ou a falta dele) diante do desafio de perdoar ou nos concede um novo alento ou perpetua nossa paralisia emocional e espiritual. E Deus não quer isso para nós. Pois, isso não faz parte do chamado de Jesus, "Siga-Me".
Cristo deixou claro o rumo que devemos seguir na famosa oração do "Pai Nosso", quando disse: "Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores" (Mateus 6:12)—as dívidas aqui se referem a penalidades por alguma má atitude ou maldade. Ele amplifica isso ainda mais nos versículos seguintes: "Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas [os erros cometidos contra a pessoa], também vosso Pai celestial vos perdoará a vós. Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará as vossas ofensas" (versículos 14-15).
Esta declaração impressionante nos leva a uma franca realidade espiritual: Uma vez cientes do desejo e da vontade de Deus de nos perdoar os erros, então nosso desejo de perdoar aos outros deve ser igualmente proporcional ao dEle.
Diante disso, você pode protestar, dizendo: "Mas–mas–mas, isso não é possível!". Eu entendo, pois também sou humano, mas nosso Pai Celestial nos chamou para sermos como Seu Filho Jesus Cristo e não para continuar a ser como somos. Se não, como vamos responder ao chamado "Siga-Me" perdoando aos outros como fez Cristo? À medida que exploramos o assunto, devemos nos lembrar disso: Jesus nunca disse que seria fácil segui-Lo, mas Ele disse que iria valer a pena.
"Sempre pronto a perdoar"
Vamos começar compreendendo o que separa Deus do homem e o que realmente O faz um Ser que devemos adorar e imitar. Em Salmos 86:5 se retrata os incríveis atributos de Deus: "Meu Senhor, Tu és bondoso, cheio de amor e sempre pronto a perdoar; Tu sempre ajudas todos os que Te procuram" (Bíblia Viva).
Deus está pronto a perdoar. Esse atributo desafiador do verdadeiro amor é que permeia Sua existência. Sem dúvida, Deus está sempre inclinado e pronto a perdoar.
Não há exemplo maior dessa disposição do que o registro expresso de um homem morrendo pregado a uma cruz de madeira. Jesus, no Gólgota, dando Seus últimos suspiros, diz para as pessoas ao Seu redor: "Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem" (Lucas 23:34).
Nesse momento é que percebemos não apenas o imediatismo de um espírito pronto a perdoar, mas também a sinergia entre o que Jesus pregou (Mateus 6) e o que agora pratica sob as mais difíceis circunstâncias.
O cristianismo 101, simplesmente implica em estar completamente comprometido com o fato de que Deus não nos pede para fazer nada que Ele já não tenha feito. Precisamos lembrar de tudo o que Deus fez por nós por causa do que nós eramos antes dEle nos perdoar por meio de Sua graça salvadora.
Às vezes nos esquecemos de que Cristo nos tirou do caminho errado e disse: "Siga-Me". O perdão misericordioso de Deus não é nossa propriedade particular e sim para ser compartilhado com os outros. O que dizemos e fazemos define esse entendimento.
Há muito tempo alguém teve essa compreensão. Em um cemitério próximo à cidade de Nova Iorque foi gravada uma mensagem curta numa lápide: "Perdoado". A mensagem é simples e direta. Não há nenhuma data de nascimento ou epitáfio. Há somente um nome e essa palavra. Isso é um incrível testemunho da nossa existência temporária perante o nosso Criador—o grande perdoador.
Mas isso representa apenas a metade da equação. Aceitar verdadeiramente o perdão de Deus significa também que devemos estar prontos para perdoar. Pois, simplesmente aceitar o perdão divino e não estar preparado para perdoar os outros significa ser meio cristão. Isso seria como estar meio grávida! Não funciona assim. Ou você é ou não é.
Isso é um desafio para todos os que procuram seguir a Cristo. Um dia John Wesley, evangelista britânico do século dezoito, falou com o fundador da colônia norte-americana da Geórgia, General James Oglethorpe, sobre um indivíduo corrupto e o general disse: "Eu nunca vou perdoá-lo". Diante disso, Wesley disse-lhe: "Então, eu espero que senhor nunca peque!"
Avançando além de nossas feridas e dores
Como podemos ir além da atitude desse general e de nossa demasiada e frequente miopia espiritual para ampliar as palavras daquela lápide para "perdoar e ser perdoado"? Um cristão deve entender que precisa abraçar três grandes verdades:
1. Fomos perdoados e agora estamos sob a contínua graça de Deus. O salmo 103 nos diz para olhar para o alto e louvar ao nosso Salvador pessoal: "Bendize, ó minha alma, ao Senhor, e não te esqueças de nenhum de seus benefícios. É Ele que perdoa todas as tuas iniquidades e sara todas as tuas enfermidades" (versículos 2-3), "Quem redime a tua vida da perdição" (versículo 4), que "não nos tratou segundo os nossos pecados, nem nos retribuiu segundo as nossas iniquidades" (versículo 10) e Quem afastou as nossas transgressões "quanto está longe o Oriente do Ocidente" (versículo 12). Parece que esta sempre é Sua disposição de coração, não é mesmo?
2. Embora perdoados, ainda somos imperfeitos, embora estejamos nos esforçando a copiar o Deus perfeito. O apóstolo Paulo tinha algo a dizer sobre isso em Romanos 7:18-19: "Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e, com efeito, o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem. Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero, esse faço". Aqui o apóstolo está nos lembrando de que todos nós ainda temos que trabalhar seriamente na nossa vida espiritual.
3. Porque fomos perdoados, então devemos nos manter inclinados a perdoar os outros. O que recebemos de Deus nós devemos compartilhar com os outros seres humanos. Atos 20:35 nos lembra da equação completa do cristão: "E recordar as palavras do Senhor Jesus, que disse: Mais bem-aventurada coisa é dar do que receber". Sem dúvida, aceitar e expressar a soberania de Deus em nossa vida não é apenas receber o perdão, mas também dar o perdão aos outros.
Deitar fora a etiqueta de preço
Se ainda está lendo esse artigo é porque você entende sua importância, porque você aprecia o exemplo de Deus, e porque entende o perigo espiritual de não perdoar. Mas por que perdoar é tão difícil?
Permita-me citar o livro de Tim LaHaye, edição 2010, A Raiva É Uma Escolha:
"O perdão custa muito caro. Custa muito para você e não à pessoa que está sendo perdoada. O perdão significa que a justiça nem será sempre feita. O perdão não significa reconstruir uma casa que foi incendiada por alguém que brincava, descuidadamente, com fósforos. O perdão nem sempre consegue reatar um casamento. O perdão não devolve a virgindade à uma vítima de estupro. O perdão significa deixar passar. É o alívio desse aperto mortal que a pessoa está sentindo" (p. 88).
Sim, é deitar fora a etiqueta de preço do que custa a você. Sem dúvida, não é fácil perdoar, mas considere estas alternativas: 1) ser um escravo das injustiças do passado, 2) tornar-se refém dessas emoções diariamente, 3) privar seus entes queridos e a você mesmo de uma vida feliz.
Deixe-me compartilhar com você uma história acerca do trabalho árduo e do grande benefício trazido pelo processo do perdão. Durante a Segunda Guerra Mundial muitas famílias holandesas esconderam judeus do horror do regime nazista. Algumas pagaram com suas vidas, enquanto outras foram encarceradas. Corrie ten Boom, que mais tarde se tornaria uma renomada escritora e palestrante, foi uma dessas pessoas. Em 1972, ela compartilhou sua jornada do perdão na revista Guideposts em um artigo intitulado "Eu ainda estou aprendendo a perdoar".
Anos depois de sua experiência do acampamento de concentração na Alemanha nazista, ela estava dando uma palestra sobre o perdão numa igreja em Munique e se encontrou frente a frente com um dos cruéis guardas desse campo nazista, onde ela e sua irmã passaram pela situação vexatória de caminharem nuas diante daquele homem. Sua irmã tinha morrido naquele lugar horrível. Agora, esse homem estava lhe dizendo que tinha se convertido e agora era um cristão e, então, lhe estendeu a mão, perguntando: "Você me perdoa?".
Ela escreve: "Ainda assim, lá estava eu com o coração dominado pela frieza. Entretanto . . . a vontade pode funcionar indiferentemente da temperatura do coração . . . "Jesus, ajuda-me", supliquei silenciosamente . . . Então, sentindo-me um robô, coloquei minha mão mecanicamente na mão que me estava estendida. E, enquanto o fiz, algo incrível aconteceu".
"Uma corrente começou no meu ombro, correu pelo meu braço e saltou para nossas mãos unidas. Em seguida, esse calor restaurador parecia inundar todo o meu ser, trazendo lágrimas aos meus olhos. 'Eu te perdoo, irmão', exclamei, 'com todo o meu coração!'. Por um longo instante, seguramos a mão um do outro, o ex-guarda e a ex-prisioneira. Posso dizer que nunca experimentei o amor de Deus de forma tão intensa como naquele momento".
Nesse exemplo, vemos uma verdade profunda: Perdoar é libertar um prisioneiro —e descobrir que este prisioneiro era você.
Alguns anos atrás, eu e minha esposa estávamos participando de um velório em um cemitério. E ali, naquele terreno de grama verde e bem cuidada, nos deparamos com uma lápide que lembrava àquela que tinha a inscrição: "perdoado". Mas, nessa lápide tinha simplesmente um nome, a data de nascimento, um traço, a data da morte e uma frase curta.
Muitas vezes, é no silêncio ensurdecedor que Deus faz a Sua maior obra em nós, quando permitimos. Aqui o traço ganhou força por causa de três palavras gravadas que, sem dúvida, dizia tudo: Jesus é o vencedor.
E agora, que tipo de pessoa que você vai ser?
Agora, por favor, leia com atenção. Será que isso significa que devemos aceitar nos submeter continuamente a comportamentos prejudiciais, como o abuso verbal, emocional, físico ou sexual e apenas deixar passar? É isso que significa perdoar? Absolutamente não! Às vezes, não temos mais 'faces a dar' quando continuamente "damos a outra face".
O verdadeiro amor, sabedoria e paciência nos ensinam que precisamos de tempo para lidar com alguns assuntos e algumas pessoas, talvez um longo período de tempo, e de uma preparação espiritual expressiva de nossa parte, à luz do exemplo de Cristo. Gálatas 6:1-2 deixa isso muito claro: "Irmãos, se algum homem chegar a ser surpreendido nalguma ofensa, vós, que sois espirituais, encaminhai o tal com espírito de mansidão, olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado. Levai as cargas uns dos outros e assim cumprireis a lei de Cristo".
Com algumas pessoas temos que perdoar sem necessariamente estar reconciliados com elas neste momento. O perdão significa não guardar rancor. Devemos querer que os ofensores arrependam-se em vez de desejar vingança.
Simplesmente, alguns assuntos e pessoas vão precisar estar sob o compromisso providencial de Deus para virem a ser reconciliados com Ele e restauradas conosco no tempo perfeito determinado por Deus. Mas até lá, temos que seguir em frente com o coração desejoso de perdoar assim como fomos perdoados.
E agora, você vai praticar o perdão? Siga o exemplo de Jesus Cristo. Ele estará sempre com vocês ao longo do caminho, enquanto você pratica o cristianismo 101—durante o qual você não pode desperdiçar a oportunidade, o tempo ou a pessoa que precisamos de perdoar! BN