Escrita para todas as Eras
No início de seu ministério, Jesus Cristo destacou uma qualidade espiritual que permeia o coração daqueles atendendo o convite pessoal para segui-Lo. Ele simplesmente disse: "Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia" (Mateus 5:7) . Além disso, Ele também afirmou que não devemos condenar os outros (Mateus 7:1-2). É fácil ponderar esses elevados ideais, mas como manter uma perspectiva misericordiosa e altruísta?
Vamos encarar os fatos simples: Quase sempre estamos prontos para apontar o dedo para os outros, por alguma falta, mas somos lentos ao julgar a nós mesmos em primeiro lugar. Uma atitude de misericórdia para com os outros só pode vir de uma consciência misericordiosa, que tanto precisamos. Jesus foi confrontado numa situação onde as pessoas se demonstravam ligeiras em condenar enquanto que não enxergavam suas próprias atitudes pecaminosas — e foi justamente nesse ponto que Ele as tocou, literalmente salvando a vida de outra pessoa condenada no processo.
Vamos analisar o que aconteceu — e que atitude devemos ter quando estamos diante dos pecados dos outros.
Apanhado em flagrante!
Começamos acompanhando a Jesus no início da manhã, onde Ele está ensinando dentro do complexo do templo em Jerusalém (João 8:1). Apenas um dia antes, no sétimo e último dia da Festa dos Tabernáculos, Ele instigara a multidão proclamando: "E, no último dia, o grande dia da festa, Jesus pôs-se em pé e clamou, dizendo: Se alguém tem sede, que venha a mim e beba. Quem crê em mim, como diz a Escritura, rios de água viva correrão do seu ventre" (João 7:37-38). O pretexto para esta declaração foi um ritual realizado durante a festa — a cerimônia do derramamento de água no altar do templo, que atingia seu auge no sétimo dia.
Muitos se maravilharam com as palavras de Jesus, no qual Ele basicamente proclamou ser o Messias e o Senhor Deus de Israel, a fonte das águas vivas do Espírito Santo de Deus. Outros, no entanto, ficaram ofendidos e "queriam prendê-lo, mas ninguém lançou mão dele" (versículo 44).
Agora, no dia seguinte, mais uma vez Ele estava pregando ao público no complexo do templo — este dia que é a festa santa do Oitavo Dia, imediatamente após a Festa dos Tabernáculos.
Ela é um Dia Santo, um tempo sagrado, aonde os inimigos de Jesus acharam que tinha uma oportunidade para lançar uma armadilha infalível para tentar desacreditá-Lo e condená-Lo diante da multidão.
Enquanto Jesus estava ensinando, os escribas e fariseus arrastaram uma mulher apanhada em adultério para frente da multidão reunida (João 8:2-3). Eles proclamam antes de tudo o que ela simplesmente não tinha sido apenas apanhada em adultério, mas "no próprio ato" (versículo 4). Isso deixa pouca margem para imaginação e menos ainda para uma possível defesa da mulher assustada.
Então, eles interpelaram a Jesus: "Na lei, nos mandou Moisés que as tais sejam apedrejadas. Tu, pois, que dizes?" (versículo 4). A pobre mulher era apenas um peão em um grande jogo. Suas ações não se baseavam no castigo dela, pois João explica que "eles estavam usando essa pergunta como armadilha, a fim de terem uma base para acusá-lo" (versículo 6, NVI).
Eles achavam que O tinham entre a cruz e a caldeirinha. Se Ele concordasse que ela deveria ser apedrejada até a morte, isso seria defender a posição deles e contrariar Sua reputação de clemente e compassivo. Mas, se Ele disse que ela não deve ser punida, então iriam acusá-Lo de contrariar a lei.
Escrevendo no chão
Enquanto os escribas e fariseus O pressionavam, Jesus se inclina e escreve no chão com o dedo como se nem sequer quisesse ouvi-los (versículo 6). Seria possível que Cristo estivesse compartilhando assuntos conhecidos por Ele, como o Filho de Deus, a respeito daqueles que estavam com as pedras nas mãos?
Outra possibilidade é apresentada em Jeremias 17: "Os que se apartam de Mim serão escritos sobre a terra, porque abandonam o SENHOR, a fonte das águas vivas” (versículo 13). Isto, aparentemente, se refere a estar escrito na areia, o que significa não ser de todo permanente — ao contrário de ser "escritos nos céus" (Lucas 10:20) no "livro da vida" (Apocalipse 13:8, 20:12, 15).
Talvez Jeremias 17:13 explique por que Jesus, depois de declarar-se a fonte de águas vivas (João 7:37-38) e, como tal, estava sendo rejeitado pelos líderes religiosos de Seus dias (versículos 45-53), ‘escreveu no chão’ quando esses líderes religiosos vieram prendê-Lo na manhã seguinte (João 8:1-9). Conhecedores dessa escritura, os mestres das Escrituras teriam ficado muito perturbados com o ato de Jesus aqui, mesmo sem ver o que Ele estava escrevendo.
Cristo, então, levanta-se e profere uma das frases mais memoráveis já proferidas: "Aquele que dentre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela" (versículo 7). Jesus não desconsiderou o que a mulher tinha feito, porém chamou a atenção para seus acusadores. Por quê?
Vamos primeiro entender que Aquele quem os israelitas conheciam como Deus, no período do Antigo Testamento, era o mesmo Ser divino que veio à terra como Jesus Cristo (ver João 1:1-14 e nosso guia de estudo bíblico gratuito Jesus Cristo: A Verdadeira História). E Ele tinha dado a Israel um sistema de leis — que incluía a execução de adúlteros. Então, qual era o problema com o processo aqui?
O problema que alguns têm notado é que eles não cumpriram a exigência encontrada em Levítico 20:10 e Deuteronômio 22:22 de que tanto o homem quanto a mulher apanhados em adultério deveriam receber a mesma punição. Onde estava o homem? É possível que ele tivesse fugido e estava foragido. Mas, como ele não foi mencionado, talvez algo mais profundo estivesse acontecendo. Talvez aqueles que professaram ter muito zelo pela lei tenham torcido essa lei para servir a si mesmos.
Ou, como apontam alguns comentaristas, o adultério, por sua própria natureza é um ato privado aonde raramente há testemunhas. Assim, ou este foi testemunhado por acaso — porém, muitíssimo suspeito, considerando o contexto e o momento — ou aquelas "testemunhas" estiveram presentes e se comprometeram no ato especificamente para armar contra Jesus, tornando-se assim coparticipantes do fato e merecedoras da mesma punição.
Independente disso, a situação deixou evidente que esses mesmos acusadores eram culpados de delitos dignos de morte segundo o mesmo sistema jurídico, uma vez que eles estavam conspirando juntos para assassinar Jesus (João 7:19, 25, 30). Além disso, esse mesmo evento era parte de uma conspiração para desacreditá-Lo e retratá-lo com um fora-da-lei digno de morte. Por isso, ultrajante e hipócrita é o fato de eles se apresentarem como juízes, júri e carrascos e presumirem estar exercendo a justiça divina nos outros. Jesus não seria parte desta farsa do sistema jurídico que Ele havia estabelecido.
Depois de dizer aos acusadores que primeiro examinem-se a si mesmos, Jesus inclinou-se novamente e continuou escrevendo na terra. A Escritura afirma que o grupo de acusadores começou a desfazer-se lentamente, começando com os mais velhos, até que todos foram embora (João 8:9). Nesse desfecho completamente inesperado dos acontecimentos, em vez de a mulher ter sido sentenciada e condenada, estes homens aparentemente auto justos é que se viram sentenciados e condenados por suas próprias consciências.
Um grande contraste de mentalidade e enfoque
Neste ponto, uma cena surpreendente é registrada na palavra. Jesus pergunta gentilmente: "Mulher, onde estão aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou?"(versículo 10). Ela responde: "Ninguém, Senhor. E disse-lhe Jesus: Nem Eu também te condeno; vai-te e não peques mais" (versículo 11).
Do ponto de vista legal, sem testemunhas, o caso foi automaticamente encerrado. A mulher estava livre para ir embora. Mas Jesus ainda tinha uma mensagem importante para aquela mulher.
Jesus não se desviou do assunto do pecado, pois mencionou isso duas vezes. Ele estava ciente de que a mulher era culpada, mas Ele decidiu lhe conceder um futuro. De modo algum essa foi uma "graça barata" ou uma atitude de fechar os olhos para a transgressão dos mandamentos de Deus. Ao conceder misericórdia, Ele não abrandou a lei, mas elevou-a ainda mais alto, dizendo-lhe para parar de pecar — se arrepender e mudar de vida.
Basicamente, Ele estava dizendo: Você tem uma segunda oportunidade. Eu estou lhe dando uma nova vida! Abandone o caminho do pecado. Eu estarei contigo de agora em diante, mas não olhe para trás e lembre-se sempre da situação em que Eu a encontrei. Os "rios de água viva", mencionados por Cristo no dia anterior, estavam rodando em volta dela naquele momento.
Aqui vemos o imenso contraste entre os mestres da lei e Aquele que veio para esclarecer sua intenção. Jesus estava preparado para perdoar e guiar aquela mulher, enquanto ainda se mantivesse na integridade da lei. Aqueles que trouxeram a mulher diante dEle, fizeram isso por pura hostilidade a Cristo e com uma atitude pré-estabelecida de condenação em suas mentes e corações.
Além disso, as ideias preconcebidas deles em relação à mulher e a Cristo justifica os meios usados para alcançar as suas más intenções. E pior ainda, essas pessoas culparam-se a si mesmos perante a lei quando foram ligeiras em condenar os outros. A incapacidade deles de terem misericórdia com os outros ou de ver a sua própria necessidade da misericórdia de Deus era marcante.
O conjunto de escolhas diante de nós
As lições para nós hoje em dia devem ser bem claras. Dum lado temos o perdão e a misericórdia e do outro lado temos a condenação e o julgamento. Estes são uma escolha contínua diante de nós. Os líderes religiosos do tempo de Jesus tinham escolhido condenar pessoas nos próprios dias de festa, que foram designados para lembra-lhes da libertação divina da escravidão do Egito (Levítico 23:22-23) e da Sua redenção pessoal para lhes dar um futuro.
Ao invés de acusar e condenar os outros, devemos olhar para o nosso próprio estado espiritual e clamar pela misericórdia de Deus. E ao recebê-la, devemos deixar o pecado e estender a misericórdia aos outros. Isso não significa que devemos desculpar o pecado dos outros. Mas precisamos estar bem com Deus, antes de avaliar a situação dos outros, como também disse Jesus anteriormente (Mateus 7:1-5).
Vamos nos lembrar de outro antigo manuscrito em uma parede na Babilônia (Daniel 5:5), que abalou os presentes naquele dia, dizendo: "MENE, MENE, TEQUEL e PARSIM" (versículo 25), parte da qual foi interpretada por Daniel assim: "Pesado foste na balança e foste achado em falta" (versículo 27).
Essa mensagem não é apenas dirigida a um antigo rei pagão, mas é uma declaração eterna que se aplica a nós, antes da chamada de Deus que torna possível uma nova vida em Cristo através de Seu sacrifício.
A misericórdia é um dom incrível. Você já pensou na diferença entre a justiça e a misericórdia? Justiça é o que exatamente merecemos pelo que fizemos, mas a misericórdia é o que nós não merecemos e ainda assim recebemos gratuitamente.
A história dessa mulher perante Cristo naquela época também é, em muitos aspectos, a história de cada um de nós. Assim como aquela mulher foi culpada e censurada por suas ações e decisões e, mesmo assim, de forma inesperada e imerecida, ela recebeu um novo sopro de vida, agora também nos encontramos diante da mesma escolha. Então, o que vamos fazer?
Se mudarmos nossas vidas e nos comprometermos com o convite direto de Cristo para segui-Lo, então podemos experimentar a mais incrível escrita manual, que não será gravada numa parede ou riscada no chão. Podemos ter a lei de Deus escrita em nossos corações e os nossos nomes inscritos no Livro da Vida para sempre!
Seremos sempre gratos pela misericórdia a nós demonstrada e “passaremos isso adiante”— exatamente como nos foi dada. Você não terá que esperar muito tempo para que surja a oportunidade nesse ambiente repleto de pessoas que você encontra todos os dias. BN