Você Apoiaria Policarpo?
A multidão gritava cada vez mais alto no anfiteatro romano em Esmirna, exigindo a morte de mais cristãos. “Fora com os ateus!”, eles gritavam, referindo-se aos que se negavam a adorar os deuses romanos. Muitos cristãos já haviam sido mortos na arena durante esse período de jogos violentos.
“Tragam Policarpo!”, gritavam, a quem mais tarde chamariam de “destruidor de nossos deuses, que ensina muitos a não sacrificar e nem adorar”.
Depois de alguns dias, Policarpo foi encontrado e levado perante o magistrado romano no anfiteatro. E a multidão clamava por sua morte, então o procônsul o pressionou a jurar pelo espírito de César e amaldiçoar a Cristo, dizendo para ele: “Jure por César e eu o libertarei; negue a Cristo”.
Policarpo se recusou, dizendo: “Há oitenta e seis anos sirvo a Cristo, e Ele nunca me fez mal. Como quereis que eu negue o meu Deus e Salvador?”.
A pressão aumentou e o magistrado o ameaçava ser morto pelas feras ou pelo fogo, e prometeu novamente libertá-lo se ele renunciasse à sua fé.
Sem dúvida, um momento de teste extremo para esse ancião que era um dos líderes da Igreja de Deus na província da Ásia (agora oeste da Turquia) durante o século II d.C. Ele foi instruído pessoalmente pelo apóstolo João e manteve a igreja de sua região fiel aos ensinamentos de Cristo e permaneceu firme em uma época em que outros estavam transigindo. Como um pastor dedicado, Policarpo sabia que esse momento de provação de sua fé chegaria.
Vamos aprofundar um pouco mais na história desse homem e sua época, depois retornaremos ao que aconteceu naquele dia, considerando sua resposta definitiva e qual deveria ser nossa decisão.
Uma época de provações
Policarpo viveu num período após a era dos apóstolos originais — quando os ensinamentos e as práticas que Jesus transmitiu à Igreja primitiva estavam sendo distorcidos e alterados. Aquela foi uma época de muita tensão na Igreja.
Aquela também foi uma época de mártires e extrema pressão contra a Igreja. As autoridades romanas estavam reprimindo esses subversivos que se recusavam até mesmo participar da emblemática adoração ao imperador, uma demonstração de lealdade ao Estado.
Décadas antes, Jesus instruiu o apóstolo João a escrever no livro de Apocalipse uma série de mensagens para as sete igrejas da Ásia, inclusive à Esmirna, cada uma se ajustava ao lugar e à condição espiritual dos destinatários (embora também tenham sido destinadas à Igreja ao longo das eras).
A mensagem de Cristo para os membros em Esmirna, onde Policarpo era bispo, encontra-se em Apocalipse 2:8-11. Ela tinha a intenção de ajudá-los a enfrentar um período de intensa provação e martírio. Ao referir-se ali a Si mesmo como “o Primeiro e o Último, que foi morto e reviveu”, Jesus estava assegurando a Seus seguidores que Ele está no controle da história do começo ao fim, e que o domínio dEle se estende até mesmo sobre a vida e a morte. Assim como Ele sofreu, morreu e ressuscitou à vida eterna, isso também ocorreria com Seus seguidores.
A mensagem menciona a oposição daqueles que se dizem judeus, mas que na verdade não são. Provavelmente isso se aplicava em vários níveis — não apenas à resistência dos judeus, alguns até mesmo agiam com as autoridades romanas, mas também a dos falsos cristãos (Paulo tendo se referido aos verdadeiros cristãos como "judeus interiormente" ou espiritualmente em Romanos 2:29).
Os primeiros discípulos eram judeus, mas sua crença no Cristo ressurreto trouxe um conflito com a influente fé judaica. A entrada de gentios à Igreja piorou ainda mais essa relação. Enquanto essa divisão com o judaísmo aumentava, os cristãos enfrentavam mais animosidade daqueles com quem tinham muito em comum. Alguns judeus de Esmirna estavam entre os que pediram a morte de Policarpo.
Enquanto isso, devido à perseguição, um número crescente de cristãos começava a abandonar todas as coisas “judaicas”. A Igreja primitiva guardava o santo sábado do sétimo dia. Os membros dela observavam a Páscoa e outras festas que Deus entregou a Israel. Policarpo estava celebrando a Páscoa e outras festas bíblicas. Ele ensinou as igrejas da Ásia a celebrarem essas festas. No entanto, os ensinamentos heréticos estavam ganhando terreno, sendo adotados cada vez mais por muitos cristãos do mundo romano.
Em Sua mensagem, Jesus diz que esses críticos, que afirmavam ser o verdadeiro povo da aliança de Deus, eram de uma comunhão diferente — ou seja, da sinagoga ou assembleia de Satanás.
A perseguição à Igreja pode ocorrer interna ou externamente. Aqui se identifica a verdadeira origem disso. Vinha de Satanás. A Igreja sempre lutou contra a maldade espiritual nos lugares celestiais (Efésios 6:12). Jesus quer que Seus seguidores se lembrem disso. Ele venceu Satanás e, por meio dEle, também podemos resistir aos ataques que Satanás planeja contra aqueles que seguem a verdade bíblica.
A Controvérsia Quartodecimana
Uma das grandes controvérsias entre os cristãos daquela época era a contínua observância da Páscoa por Policarpo e outros na data bíblica do dia 14 do mês hebraico de Nisã, primavera no hemisfério norte. A igreja de Roma e outras congregações ocidentais mudaram para a observância do que, posteriormente, seria chamado de Domingo de Páscoa.
Policarpo viajou para Roma para discutir o assunto com o bispo romano Aniceto, mas a controvérsia continuou sem solução:
“Pois nem Aniceto pôde persuadir Policarpo a renunciar à observância [à sua maneira], visto que essas coisas sempre foram [assim] observadas por João, o discípulo de nosso Senhor, e por outros apóstolos com quem ele havia conversado; nem, por outro lado, Policarpo conseguiu persuadir Aniceto a manter [a observância à sua maneira], pois ele sustentava que era obrigado a anuir ao costume dos presbíteros [ou anciãos] que o precederam [em Roma]” (Ante-Nicene Fathers [Pais Antenicenos, em tradução livre],Irineu, Fragmento 3, newadvent.org).
Enquanto eles buscavam a paz entre as congregações, a divisão continuava a crescer. Algumas décadas depois, o debate sobre o tema ficou mais acalorado, quando um bispo romano procurou excomungar as igrejas orientais por causa disso.
A história rotula aqueles que comemoravam a Páscoa e a Festa dos Pães Asmos, segundo o ensinamento transmitido desde a era apostólica, como quartodecimanos (ou “quartodecimani” do dia 14 de Nisã). O historiador Henry Chadwick escreveu: “Não há dúvida de que os quartodecimanos estavam certos ao pensar que haviam preservado o costume mais antigo e apostólico. Eles se tornaram hereges simplesmente por serem considerados retrógrados” (A Igreja Primitiva, Editora Ulisseia, 1967, p. 85).
Os cristãos que hoje celebram essas festas podem ter certeza de que estão observando firmemente as instruções que Deus entregou por meio de Israel e dos apóstolos.
Uma história que atravessa eras
Com esse pano de fundo, voltamos a Policarpo diante do procônsul romano sendo pressionado a renunciar à sua fé cristã sob ameaças de execução.
A história dessa fé foi registrada com mais detalhes em uma antiga carta da congregação de Esmirna conhecida como “O Martírio de Policarpo” (também reproduzida na História Eclesiástica, de Eusébio).
E diante da ameaça de ser queimado vivo, Policarpo disse: “Ameaças com o fogo que arde um momento e logo se apaga. Não conheces o fogo do juízo que há de vir e da pena eterna onde serão queimados os inimigos de Deus. Mas, que esperas ainda? Dá a sentença que te apraz!”.
Assim, ele se manteve firme em suas convicções. Logo a fogueira foi preparada e Policarpo foi amarrado na pira. Após uma última oração final sobre sua ressurreição, a fogueira foi acesa. Mas quando viram que o fogo não conseguia consumir seu corpo, foi dada uma ordem para esfaqueá-lo e ele sangrou até a morte, e quantidade de sangue que saiu do ferimento apagou o fogo. E, por insistência de alguns agitadores, seu cadáver foi completamente incinerado.
A história de Policarpo atravessou eras. Ela fala da fé numa época em que as pessoas fiéis passavam por provações de fogo — literalmente. E isso traz algumas lições para nós hoje em dia. A fé na Bíblia está sofrendo diversos tipos de ataques. Há uma contínua e crescente onda de hostilidade secular à Bíblia. E a situação é ainda mais difícil para aqueles que buscam o autêntico cristianismo bíblico.
Você defenderia sua fé contra-ataques, até a morte, como Policarpo e outros fizeram? Ele não sofreu oposição somente dos romanos pagãos, mas também daqueles que compartilhavam algo em comum a fé dele, a comunidade judaica. E com o tempo, as heresias na Igreja aumentaram tanto que os poucos que persistiram na verdade começaram a ser oprimidos e perseguidos.
O que é preciso para ficar do lado de um homem de fé como Policarpo? É preciso uma fé baseada na verdade que revela o grande plano de Deus para salvar a humanidade. As festas de Deus, as mesmas que Policarpo celebrava, celebram as etapas desse plano. Esse entendimento é algo pelo qual vale a pena lutar e até morrer, assim como fizeram Policarpo e aqueles que ficaram ao lado dele!
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