Sempre que...

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Há seis anos esta coluna tem sido dedicada à nossa resposta ao clamor e ao chamado íntimo de Jesus Cristo para “segui-Lo” (ver Mateus 4:19; João 21:19-22). Neste convite de duas palavras, o Cristo vivo acolhe e encoraja Seus discípulos, ao longo dessa jornada da vida, para nos lembrar, e também nos refrescar, a permanecer no curso e imitá-Lo em pensamento, palavra e ação — não apenas para Deus, mas também para as outras pessoas com quem convivemos.

Precisamos considerar que a lente pela qual Jesus via os outros proporcionava essa sensibilidade e cuidado. Qual a importância de se usar essa mesma lente? Toda! Na medida em que adotamos este princípio dá-se o grau em que Cristo reconhecerá nosso discipulado como genuíno — e, por isso, poderemos receber a bênção do Pai Celestial.

Um chamado para o despertar

Descobrimos surpreendentes repercussões dessa perspectiva em Mateus 25, ao final do ensinamento de Jesus no Monte das Oliveiras, alguns dias antes de Sua morte e ressurreição — uma mensagem, iniciada no capítulo 24, sobre as condições do mundo que antecederia a época de Sua segunda vinda e concluindo com uma indispensável advertência pessoal para Seus seguidores.

Ao descrever um tempo futuro de julgamento divino, descrito na Escritura como a distinção entre ovelhas e bodes (Mateus 25:31-33), Cristo disse isto para encorajar a alguns e despertar a outros:

“E porá as ovelhas à Sua direita, mas os bodes à esquerda. Então, dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de Meu Pai, possuí por herança o Reino que vos está preparado desde a fundação do mundo; porque tive fome, e destes-Me de comer; tive sede, e destes-Me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-Me; estava nu, e vestistes-Me; adoeci, e visitastes-Me; estive na prisão, e fostes ver-Me” (Mateus 25:33-36).

Nesse cenário, os “justos” ou “as ovelhas” seriam os que, efetivamente, respondem (parafraseando o versículo 36): “O quê? Quando isso aconteceu?” “E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que, quando o fizestes a um destes Meus pequeninos irmãos, a Mim o fizestes” (versículo 40, grifo nosso).

Jesus continua a repreender e julgar aos que estão à Sua esquerda, “os bodes”, proclamando: “Afastem-se de Mim”, citando sua falta de sensibilidade e cuidado quando confrontados com as mesmas circunstâncias (versículos 41-46). Ele reafirma, especificamente, o motivo para tal julgamento no versículo 45: “Em verdade vos digo que, quando a um destes pequeninos o não fizestes, não o fizestes a Mim”.

Com Cristo tudo é muito pessoal

Agora, vamos intensificar nosso exame dessa passagem (versículos 31-46) e observar algumas conclusões surpreendentes. Primeiro: tudo isso é muito pessoal com Cristo. Aqui, por treze vezes, Ele usa a palavra “Me” (Ele próprio) em relação a "um destes pequeninos". Isso seria como se Ele estivesse identificando intimamente todos aqueles a quem Seus seguidores vão acabar encontrando no decorrer da vida.

Deliberadamente, Ele personaliza 25 vezes nossos encontros com os outros, referindo-se a "você". Você e eu assumimos a responsabilidade por nossa abordagem e encontros com os demais. E considere que isso, geralmente, é um contato pessoal a dois. O modo como você trata uma pessoa não é meramente singular, mas plural no sentido de que Cristo não apenas se identifica com cada um desses indivíduos como receptor desse tratamento, como também Ele diz que “o menor deles” são “Seus irmãos”.

Por duas vezes, nesta passagem esclarecedora e que desperta o coração, Cristo usa a palavra “quando” ou “sempre que” como o grande equilibrador do julgamento. O dicionário Michaelis define esse termo como “na ocasião em que” ou "assim que” (michaelis.uol.com.br). Jesus está afirmando claramente que nossa preocupação com os outros é um reflexo direto de nossa preocupação por Ele. E que o nosso desdém ou indiferença em relação ao sofrimento dos outros nos distancia não apenas destes, mas também dEle.

Nesse ponto, você pode estar dizendo a si mesmo: "Sou uma pessoa compassiva e, quando vejo pessoas em circunstâncias difíceis, tento fazer alguma caridade por elas nessa ocasião”.

Sem dúvida, isso é muito bom, mas pretendo expandir sua percepção sobre tudo o que Cristo está dizendo aqui. Estou abordando algo que vai além de atos aleatórios de caridade e percepção de bondade dentro de nossas possibilidades. Eu estou falando sobre ser uma testemunha de Jesus Cristo num mundo escuro que tem estado espiritualmente faminto e moribundo desde que a humanidade rejeitou a Deus no Jardim do Éden.

Hoje em dia, nosso mundo está sofrendo cada vez mais pela epidemia da falta de sentido — infectado por uma cultura secular desprovida do Autor da vida. A humanidade está presa em um seu próprio cárcere, baseada na decisão de rejeitar a soberania amorosa de Deus de moldar a vida das pessoas à Sua imagem. No entanto, continua sendo este o propósito de Deus.

Observando através das lentes do grande propósito de Deus

Por qual lente Cristo via os outros? Podemos ver isso bem no início das Escrituras. As primeiras quatro palavras do primeiro capítulo de Gênesis são o motor propulsor do restante das Escrituras. “No princípio, Deus...! Nem eu nem você — Deus! E esse mesmo Deus declarou Sua grande decisão de nos trazer à existência, dizendo: "Façamos o homem à Nossa imagem, conforme a Nossa semelhança” (Gênesis 1:26).

E isso se tornou realidade. O versículo seguinte nos diz: “Criou Deus, pois, o homem à Sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” (versículo 27, ARA).

Entretanto, o plano divino exposto diante de nós vai além da criação do homem. Em última análise, o propósito de Deus é, passar de uma criação física de barro para uma nova criação do Espírito (2 Coríntios 5:17) — para sermos realmente como Ele. Assim, o homem foi feito da imagem de Deus e exige todo nosso respeito. Devemos honrar o que Deus está fazendo, que tem a ver com todas as outras pessoas criadas à Sua semelhança.

Gênesis nos informa que a humanidade não gostou dessa criação incrivelmente especial à semelhança de Deus. A consideração pela vida humana evaporou-se após a época de Adão e Eva, o mundo pré-diluviano ficou repleto de violência (Gênesis 6:13) e os pensamentos das pessoas eram continuamente maléficos (versículo 5). Provavelmente, aquela era uma sociedade homicida!

Podemos ver mais indicativos disso depois que Noé e sua família deixaram a arca. Deus fez um pacto dirigido à preciosidade de Sua criação especial: “certamente requererei o vosso sangue, o sangue da vossa vida; da mão de todo animal o requererei, como também da mão do homem e da mão do irmão de cada um requererei a vida do homem. Quem derramar o sangue do homem, pelo homem o seu sangue será derramado; [Por quê?] porque Deus fez o homem conforme a sua imagem” (Gênesis 9:5-6). Deus deixou claro que aqueles que Ele criou à Sua imagem devem ser bem tratados.

Agora você pode estar dizendo: “Mas como isso se aplica a mim? Eu não tirei a vida de ninguém!” A verdade é que você não tem que, literalmente, matar ou destruir pessoas para extinguir suas vidas e torná-las “mortas-vivas”. Há mais de 3.500 anos, Jó implorou a seus amigos: “Até quando vocês vão ficar me atormentando e me ferindo com as suas palavras?” (Jó 19:2, BLH).

O apóstolo Tiago escreveu que usamos nossa língua para louvar a Deus, mas, infelizmente, também a usamos para “amaldiçoar as pessoas, que foram criadas parecidas com Deus” (Tiago 3:9, BLH).

Somos todos irmãos por compartilhar essa semelhança. E Jesus declarou que não apenas os assassinos reais, mas também “qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão será réu de juízo”, ou seja, esse desdém expresso pode ser ainda mais perigoso (Mateus 5:21-22).

O apóstolo João escreveu: “Se alguém diz: Eu amo a Deus e aborrece a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama seu irmão, ao qual viu, como pode amar a Deus, a Quem não viu?” (1 João 4:20).

Cristo via os outros à semelhança de Si mesmo e do Pai em relação ao propósito para o qual foram criados — essa é a lente através da qual devemos também vê-los. E, assim como Deus os ama, nós também devemos amá-los — caso contrário, não nos importamos com o que o Pai e Cristo cuidam e, portanto, não os estamos amando e confiando naquilo que Eles estão fazendo.

Mantendo o foco necessário

Vivemos em um ambiente repleto de oportunidades para demonstrar dignidade e respeito à criação especial de Deus, feita à Sua imagem, e devemos ter isso como nosso ponto de partida.

Sabemos que o toque físico e as conexões verbais e emocionais são vitais para os bebês. Sem isso, eles simplesmente não se desenvolvem. Mas com os adultos seria diferente? No entanto, às vezes as pessoas mais próximas de nós — seja nossa esposa, filhos, colegas de trabalho, irmãos na fé — são aquelas que se sentem distantes de nós e se sentem “pequeninas”, mas não à lente de Cristo, e sim aos nossos olhos.

As pessoas são difíceis? Mesmo aquelas mais próximas de nós? Evidentemente! Os relacionamentos podem ser bem complicados. Mas precisamos partir da perspectiva de Cristo em relação à vida dos outros. Reconheça que todos nós somos feitos à imagem de Deus — inclusive a pessoa com quem você agora pode estar tendo problemas — e lembre-se sempre de que Cristo já morreu por toda a humanidade. E mesmo que, hoje em dia, a maioria das pessoas não O conheça ou entenda o que Ele fez por elas, isso não nos exime da responsabilidade de agir como Cristo. Na verdade, é por isso que elas precisam de nossa misericórdia e compaixão!

O que há com a natureza humana que muitas vezes esquece-se de lembrar? Bem, vamos nos concentrar aqui. Vocês se lembram de quando Cristo os escolheu no percurso de suas vidas e lhes ofereceu dignidade e segurança e deu-lhes uma paz interior que nunca haviam experimentado antes? Sim, e quando estávamos sedentos por um significado na vida enquanto lutávamos para "fazer as coisas à nossa maneira" e sem Deus? E isso estava dando certo? Claro que não.

Então, recebemos um chamado de nosso Pai Celestial (João 6:44) e um convite pessoal de seguir a Jesus Cristo. Na ocasião, não fomos ignorados, menosprezados, deixados à espera ou vistos como algo irrelevante. Deus escolheu nos favorecer, e recebemos um crachá que demonstrava que fazemos parte, somos "Seus irmãos". E melhor ainda é estar na própria família de Deus!

Será que eu ou você somos pessoas difíceis? Claro, mas mesmo assim Deus nos ama e cuida de nós — considerando sempre o que Ele pretende para nossas vidas. E assim devemos amar e cuidar dos outros, olhando para eles com foco no cuidado amoroso de Deus e com o propósito final para o qual Ele os criou. Se realmente amamos a Deus, também os amaremos.

Depois de compartilhar esse tempo comigo lendo esta coluna e na medida em que exploramos o coração de Cristo através de Suas próprias palavras, saiba que minha maior esperança, e desejo sincero de Deus, que você veja os outros seres humanos com uma nova perspectiva, através do olhar de Jesus Cristo!